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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Nas estradas que levam ao caminho do sertão.


Fábio Trancolin


O pensamento foi longe e de tão longe me levou ao ver dois moleques de 15 e 16 anos com mochilas nas costas numa estradinha de poeira vermelha, e o cerrado com cheiro característico do amanhecer. “Eu vou voltar pro meu cerrado”, e embalar num cheiro do passado a caminho das terras lá pra bandas do “rasgado”. Certo dia, eu e o Jairinho resolvemos que iríamos para a fazenda onde morava Sebastião Fagundes, mais conhecido por “Tião Catira”. Ela ficava lá para os lados do Ribeirão do meio, sentido a esquerda depois do aeroporto. Saímos de casa cedo, e colocamos o pé na estrada, mais ou menos estilo Renato Teixeira, “amanheceu, peguei a sacola e fui viajar”. A ideia era pegar carona, chegamos no acesso a GO 174 sentido Caçu, e até ali nada, só a pé. Pra chegar na fazenda, tínhamos que andar quase uns 30 km, passou uma caminhonete e nos deu carona até determinado ponto, foi pouco, mas já ajudou. E a maior parte de percurso foi feito na sola mesmo.


Chegamos à roça, mortos de fome, levamos mochilas, porém mantimentos nada. Mas, isso era o de menos, o importante era estar lá. Na casa, morava o Tião, a mulher dele a Carminda e, o Tiãozinho o cunhado, e o filho Ruiter. Lá ele era o caseiro, o vaqueiro, o faz de tudo. Tião era um sujeito boa praça, tinha várias histórias a seu respeito, diziam que ele que fazia a suas próprias espingardas e colocava o cunhado para experimentar, mas antes tomava o cuidado de se proteger (vai que o experimento não dá certo). Tião, também, era um sujeito nervoso perdia a paciência muito fácil; tirando leite, se a vaca não ficasse quieta ele mordia na orelha dela... Era uma “figura”, deixou saudades. Por muito tempo, trabalhou nas terras do Iron Ferreira. E onde ele morava ao fundo se ouvia a cachoeira do Rio do Peixe, lugar bom de pescar. E por falar em pescaria logo fomos preparar as tralhas.


Todo dia tinha pescaria no ribeirão que dava nome ao lugar, “Córrego rasgado”, quantas traíras, lambaris e ‘lobós’ fisgamos... Certo dia, resolvemos que iríamos pescar na cachoeira, e fomos, para atravessar para o outro lado onde tinha o melhor ponto, o único apoio era um arame amarrado de um lado ao outro, hoje paro pra pensar como é que eu fiz aquilo, atravessar na correnteza e quase ser levado rio abaixo, sem noção, loucura, Mas, fizemos e valeu a pena, a pescaria foi satisfatória.

Mas, não era só peixe, o fogão, a lenha sempre tinha algo diferente, comida na roça e “trem bão dimais”. E, uma noite, o Sebastião foi à caça, pegou a cartucheira e saiu, antes deixou um recado, quando ouvir o tiro mulher, põe a água pra ferver. Então tá, pode deixar disse ela. Passando um tempo, ouve-se o estampido, e o Jairinho falou pra Carminda, então? Ela disse, vamos esperar... Passou um tempo, entra o Tião “nervoso” e joga um ratão do mato no chão, “matei essa disgraça escutei mexer no milho, liguei a lanterna e atirei, mas num era paca, foi isso que eu matei”. Isso virou piada...


Uns dois dias depois, lá vai o Tião de novo com espingarda nas costas, mas, dessa vez não teve aviso. Demorou, então ouvimos os disparos, será? Passado um tempo lá vem o homem, todo orgulhoso com dois tatus, um o tiro estraçalhou não teve como aproveitar, o outro virou farofa. Ficamos por lá uns 15 dias. A casa de pau a pique, de lugar agradável, e de muitas histórias de mentiroso ao redor do fogão, ouviram por lá. 


A estradinha das pitangas, gabirobas e dos pés de pequis, e do belo entardecer do cerrado, ao som do jaó, perdiz e inambu, seriema ao longe cantou, carcará no pau a observar o chocalho da cascavel no balançar dos guizos no seu som a assustar. Tatupeba e bola, lobo-guará, as cotias e pacas que na noite que vem vindo, elas saem a espiar. Os tamanduás e os campeiros com medo se escondem nas árvores retorcidas que os protegem (protegiam). As pintadas e tantas histórias das zagaias que atravessaram as belas pintas. E você que lembrou e chorou, eu também choro. Choro por tudo que nós tivemos e hoje só lembrança deixou. E seria tão bom permanecer nessa estrada... Nas estradinhas que levam ao caminho do sertão.





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