Fábio Trancolin
Em São Paulo, no Bairro da Santa Cecília
existe o comércio de móveis usados conhecido como “Lixão”, nesse local encontram
peças raras e a beleza da decoração, o que para uns é velharia para outros é
pura arte. Esse comércio é antigo e uma prática muito utilizada. Em 1978 o pai
em parceria com um ‘amigo’ resolveram colocar o comércio de móveis usados em
Rio Verde, e denominaram de Pregão (o pai
foi o primeiro na cidade). Os moldes seria no mesmo da Santa Cecília, só
que aqui não tinha muita arte, eram mais utensílios domésticos, que as pessoas
por vários motivos descartavam e vendiam.
O Pregão
foi instalado na Rua Costa Gomes, 617 (hoje é a Divipiso). E foi decidido
que além de ter os móveis usados, também, teria móveis novos que o pai fazia,
ele era exímio marceneiro fabricava as famosas salas de jantar, que a alta sociedade da época adorava e muitos
colocaram em suas casas a beleza da arte da madeira, alguns ainda conservam em
suas residências essas peças. O comércio foi aumentando e melhorando, tinha de tudo
ali amontoado. E descartavam de tudo, o que para uns era empecilho, para outros
era luxo. E tinha os que vendiam pela necessidade, muitos viam vender e
desfazer de bens, às vezes, para comprar remédios, enterros, pagar as contas e
até comer. Esse era um ponto que desagradava o pai, ver pessoas se desfazerem
dos móveis para isso.
Foto ilustrativa |
A ‘loja’ prosperava, porém um dia o ‘sócio
amigo da onça’ do pai, fugiu, escafedeu, desapareceu... Deram notícias de que
ele tinha adquirido uma Brasília Zero Km, e simplesmente foi embora, o dinheiro
da aquisição do carro, imagina de onde ele tirou... Assim o ‘pregão’ ficou no
prego, e baixou as portas. Então o pai teve outra sociedade, abriu outro, dessa
vez o endereço era na esquina da Augusta Bastos com a Laudemiro Bueno (hoje é a
Papelaria Faria/Portinari). O pai cuidava da marcenaria e o sócio da tapeçaria,
esse no tempo em que esteve aberto foi muito bem, porém por falta de tempo na
dedicação do empreendimento, ele fechou mesmo sendo um sucesso, bons tempos
aqueles.
O pai fez outra tentativa dessa vez em frente
ao Colégio do Sol, na Rua Goiânia, o sócio foi um sobrinho, o Hélio, as
entregas eram feitas numa carroça, porém o cavalo sumia umas duas vezes por
semana, coincidência ou não, todas as vezes quem encontrava o ‘fujão’ era
sempre o mesmo cigano, e tinha que dar uma recompensa para ele... A última
tentativa foi com outro sobrinho o Hélcio, dessa vez foi no Bairro Popular, na
Rua 19, hoje o espaço é utilizado pelo Supermercado Economia, que naquela época
era apenas o Armazém do Seu João, era uma parte da cidade carente e esquecida
no inicio da década de 80, era chamado de forma pejorativa de ‘Vilinha’, bairro distante e que sofria
certa rejeição da parte central da cidade. Hoje, o Bairro Popular é
independente valorizado e comércio forte.
No final da década de 70, meu pai idealizou e
não prosperou, então ele preferiu só fabricar móveis para os pregões da região
que começavam a propagar, nós vendíamos camas, mesas e cadeiras, e as
cantoneiras (usava-se muito naqueles tempos para colocar o filtro, hoje nem sei
se utiliza mais...) para Santa Helena e Quirinópolis, a marcenaria fabricava a
semana toda e na sexta ou sábado eles viam buscar a produção da semana. Isso
durou até 86.
Foto ilustrativa: Torno Invicta |
No início de 87, eu coloquei fim na
marcenaria vendendo a última máquina, a derradeira peça a nos deixar foi o
Torno Invicta. Tínhamos a Circular, a Furadeira, a Tupia e a Plaina, e todas
elas foram vendidas para o Orlando. O torno era especial, ele muito nos ajudou,
nos períodos difíceis ele sempre nos amparou. Quantas e quantas peças o meu
irmão torneou, esse trabalho fez dinheiro que chegava em momentos complicados,
e sempre tinha algo para o formão desbastar. Recordo-me no momento em que
fechei negócio com o Orlando, entregando-lhe a máquina e recebendo Cr$ 30,000,
quantia insignificante para o valor que ele tinha... Ali finalizava a marcenaria que nos
proporcionou estudos, alimentação e tudo mais... O cheiro da cerejeira, da
peroba rosa, do jatobá, a serragem acumular, o verniz e da cola ‘fórmica’
invadia as narinas... O sonho de madeira acabou e o cheiro ficou na lembrança
de menino que foi criado no meio da arte do entalho e do retoque da lustração.