Fábio
Trancolin
Eu
tenho andado pela cidade, eu fico observando e escutando. Testemunho a sua
destruição e reconstrução, a beleza que ela tem e não tem... Passo por lugares tão familiares e que, às
vezes, não reconheço. Como você mudou ou podemos dizer transformou. Não és mais
a menina da aldeia, e nem mesmo a moça na janela que esperava o cowboy de lenço
vermelho no pescoço... “Toca o berrante
seu moço... “ Até pouco tempo tu era passagem de boiada. Você mudou e mudou muito. Para aqueles que não andam por tuas ruas,
assustam, pois perguntam cadê aquela casa... Nossa caiu, e aquela outra não
existe mais, nossa venderam essa também! Nem aquelas que eram para ser
patrimônio são preservadas, elas tombam não historicamente, mas, sim, para dar
espaço para o progresso que vem acompanhado da explosão e exploração
imobiliária.
Eu
te observo, vi e vejo a tuas mudanças. Nos tempos de criança, os cinemas com os
cavaletes na porta nos convidava a “espiar” o que dizia o letreiro, eram três
estabelecimentos que nos traziam a 7ª arte. Tínhamos o Cine Presidente, o
Rio-verdense e o Bagdá, que depois virou Regente e perdeu a regência, as
cortinas se fecharam, os chamados cinemas de rua perderam espaço e se
transformaram em salas no shopping, ao lado tem a área de alimentação com as
suas franquias de lanches rápidos no fast
food e americanizou.
As
tuas praças de namorados de mãos dadas de juras eternas ao brilho da água do
chafariz, pipoqueiro, vendedor de rosas não te vejo mais. As moças com as saias
rodadas mediam a praça de um lado para o outro no, paquera e na mais pura
ingenuidade. A antiga Praça Castelo Branco (hoje Praça José Maria Barros) com
as suas luminárias que saiam do chão e encantavam as crianças que desciam
pulando e subiam também. A beleza das árvores da Praça 5 de agosto e os seus
bancos que convidavam para uma bela
prosa num final de tarde. O espaço da Praça da Matriz que trago na memória um
cheiro de vem, vem brincar e correr, hoje o cheiro é outro e te convida sim, a
sair correndo do perigo constante a te observar.
Nas
bancas das “frutarias” principalmente as que tinham no Mercado Central a “banana
de fritar” madurinha com a casca preta. O queijo, a farinha e polvilho a
garrafa de pimenta amarela e vermelha tanto uma como a outra arde à boca,
docinho na palha para adocicar. Feijão de quilo, amendoim na casca, a balança
com as bandejas o peso a equilibrar. Frango vivo dependurado junto à gairoba, gueiroba,
gueroba ou guariroba tanto faz o nome, você sabe o delicioso amargo que
tem. Final de outubro, cheiro de pequi
invade as narinas, quem não come, aprende.
Os
bares e “armazéns de alguém” perderam o espaço, hoje não se tem o balcão para
sentar e a prosa trocar. O bar do João Surdo, João Jayme, os armazéns do Zé
Mineiro e do Zé da Venda e outros ‘Joãos’ e ‘Zés’ não tem mais. Não se tem
tempo, para num tamborete sentar e o assunto prolongar... Hoje os bares são outros e as pessoas
conversam via internet, estão conectadas no WhatsApp, ah, geração de cabeça
baixa...
As
músicas do passado eu também relembro, quando elas chegavam através da sintonia
da Difusora AM que ficava na esquina da Avenida Presidente Vargas com a Rua
Almiro de Moraes, e te emocionava, te convidava a ouvir e viajar nas ondas da
rádio... Yesterday, all my troubles
seemed so far way – (Ontem, todos os
meus problemas pareciam tão distantes)... Mas, mesmo quando essa mudança e
essa “miscigenação” que trombamos e vemos e ouvimos por tuas ruas, temos o
carinho por ti, que no passado foi chamada de ‘Princesinha do Sudoeste’. Tu cresceste e transformaste, já não é
mais cidade pequena, guardam ainda nas suas cancelas presas pelas tramelas da
memória. Memória que eu faço questão de não esquecer, faço, sim, te preservar e
te contar...