Na viagem do tempo, volto
a um ano em que houve muitas mudanças, e alteraram roteiros, comportamentos e
pensamentos, foram mudanças que atravessaram rios e fronteiras. As mudanças são necessárias, muitas vezes
inevitáveis, as mudanças são tão inevitáveis quanto as lembranças e, por isso,
retorno ao ano de 1981. Depois de tantos anos morando na parte baixa da cidade,
lugar que me trouxe muitas alegrias e boas lembranças. No início daquele ano,
mudamos para a Rua Augusta Bastos a casa ficava próxima ao Colégio do Sol
(ainda vou contar a história desse colégio). Pra falar a verdade, senti muito
essa mudança, saí de perto dos bons amigos, não que a cidade fosse tão grande e
as distâncias intransponíveis, não, não era isso, mas fiquei longe do ponto que
me deixava muito feliz.
No ano anterior, eu tinha
abandonado a escola, algo que me deixou muito triste, uma frase pode destruir
alguém, e alguém me disse uma frase que estragou o meu ano letivo (desigualdade
social). E, em 81, fui matriculado no colégio que deveria ter ido um ano antes,
o Oscar Ribeiro da Cunha. Meus amigos
estavam estudando na parte da manhã, eles estavam na 6ª série, eu ainda tinha
que concluir a 5ª, então tive que me contentar em estudar no período
vespertino, algo que me deixou um tanto quanto contrariado, pois alguém estava
de manhã, e eu não iria compartilhar da tua companhia, ‘O melhor lugar do mundo é a boa companhia, ou a sua companhia’. O
pai comprou todos os materiais escolares daquele ano (comprou não, trocou por
serviços, que não deixa de ser uma compra...) a Papelaria Montreal foi o pai
que fez toda a parte de prateleiras, e houve a permuta, maravilha, tudo da
melhor qualidade e quantidade.
Algumas coisas que
marcaram o mundo naquele ano já tinham acontecido, o presidente da
superpotência sofreu um atentado, e o Papa, também, tentaram matar Ronald Reagan e João Paulo II. Eles não morreram,
mas, um dos ídolos da minha infância, sim, Amâncio Mazzaropi, o jeca mais
famoso do Brasil voltou à Pátria Espiritual naquele ano, eu adorava os filmes
dele. Pelé tinha sido aclamado o atleta do século, não pelo que falava e sim
pelo que jogava... Roupa Nova lançava o primeiro LP. E a bomba dos “milicos”
tinha feito estrago no atentado do Riocentro. Mas, agora entra a parte da
mudança. No meio do ano, os meus pais decidiram que deveríamos mudar para
capital paulista. E, em casa, estava decidido, vamos mudar... Tudo foi vendido,
até o Dodge Dart 1974, amarelo ouro,
foi passado nos cobres, senti muito essa venda. E mudamos...
Rua Êneas de Barros - Colégio Professor José Campos Camargo |
Chegamos à terra da garoa no final do mês de julho,
frio, muito frio... Eu, a mãe, e o Marcello, o pai e o Jairinho ficaram por
certo tempo no Planalto Central... Eu
tinha 12 anos, tudo eram novidades, diferente e sem amigos, apenas os primos,
mas, menino logo se ambienta. No dia em que cheguei à tia Neide, ela disse, ele
vai ficar lá em casa (foi uma das melhores coisas), eu fui para a casa dela que
ficava na Rua Enéas de Barros, as primas da mesma idade a Deborah e a Claudia
logo me apresentaram praticamente toda a rua... A tia fez a matricula no
Colégio Professor José Campos Camargo, horário completamente atípico pra quem
estava acostumado em Rio Verde, em Sampa as aulas começavam 15:20 e terminavam
às 19:20, não se usava o uniforme tradicional, calça cáqui e camisa branca com
bolso bordado, era apenas um avental branco. No Oscar, eu tinha 12 matérias no ‘Camarguinho’
eram apenas seis, mas que valiam por 24, e os materiais não foram
aproveitados... Agora imagina dois ‘capiauzinhos’ vindo do interior do país e
chegar numa sala de aula de uma metrópole... Os colegas perguntavam se os
índios andavam pelados nas ruas da minha cidade e se víamos onças por perto,
essa era a imagem que pintavam do Brasil Central. Pra finalizar essa parte eu
não me adaptei ao sistema imposto pela escola e reprovei... Meu terceiro
colégio e segunda 5ª série que ia para o vinagre...
Parque do Piqueri |
Passando para parte boa,
eram os tempos das descobertas, das mudanças de comportamento... Ali na ‘Enéas’ tive a primeira namorada a
Elisabete, morena cor de jambo e belo sorriso. Os bons tempos das feiras de
sábado e as noites nas calçadas. Ali também fiz bons amigos, Paulinho,
Pedrinho, Ricardo, Rogério, Raul e o Keller. Fiquei um tempo na casa da tia,
quando o pai chegou fomos morar na Rua Embiruçu (como dizia a Claudia, era uma
rua que sobe e desce e o número nunca aparece), mas pouco ficava lá o meu
mundinho era na Enéas...
Parque do Piqueri 1981 |
Um fato que marcou aquele
ano foi o casamento da adorável e inesquecível prima Cosete. Ela casou no dia
21 de novembro, na Igreja de São Carlos no Tatuapé, 30 anos se passaram e eu
nunca mais fui a um casamento tão maravilhoso quanto aquele, foi a primeira vez
que comi caviar e calcei um tênis Topper. Naquela noite, um amigo antigo do meu
pai, que eu só conheci de ouvir falar e tive a oportunidade de conhecer naquela
noite, ele ficou muito feliz em me conhecer, foi a primeira e última vez que
vi, me presenteou com uma bela nota de Cr$ 500 para que eu fosse visitá-lo, ele
tinha bebido um tanto quanto além da conta, e não era para menos, fora servido
’Whisky Buchanan Special Reserve’. Na porta da igreja, estacionado um Del Rey
azul 0 km
que conduziria os noivos para lua de mel. Tempos depois a Cosete e o Osmar me
proporcionaram uma bela imagem, foram eles que me levaram para ver o mar... “Foi assim, como ver o mar. Foi a primeira
vez que eu vi o mar. Onda azul, todo azul do mar. Daria pra beber todo azul do
mar. Foi quando mergulhei no azul do mar. “ Escrevo essa crônica na noite
de 15 de novembro, aniversário dela, essa história simplesmente foi para
relembrar a Cosete, nesse ano fez 20 anos que ela retornou ao Plano Maior. No
dia em que ela partiu, escrevi na minha agenda “Está faltando uma peça no
quebra cabeça, perde a graça, no quadro falta algo que não completa...” Acabou
aquele ano e no início de 82 retornei para Rio Verde...