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segunda-feira, 24 de junho de 2024

Eu tenho apenas três minutos


 

Naquela época, as ruas abrigavam pequenos refúgios para conversas urgentes, outras não tão urgentes assim, servia para lembrar de alguém, para namorar, eram espaços cheios de sentimentos, saudades, paixão e anseios de esperanças, era para se comunicar com o outro lado da linha.... Esses refúgios eram conhecidos como orelhões, e sim, existia um tempo em que se fazia fila para usar um deles.



Ao longo das calçadas movimentadas, surgiam filas de pessoas segurando pequenas fichas de metal, adquiridas no bar da esquina, na padaria ou na banca de jornal. Cada ficha representava três preciosos minutos de conversa local, uma eternidade e, ao mesmo tempo, um piscar de olhos. As fichas eram pequenos discos mágicos que, quando inseridos no telefone público, conectavam corações separados pela distância.

O DDD, Discagem Direta à Distância, era um luxo esporádico, um elo tênue e breve entre estados. Com uma ficha especial, a conversa durava apenas dezoito segundos, mas nesses momentos, cada palavra ganhava um peso incalculável.


Recordo-me de uma canção antiga, uma melodia que ecoa na memória, envolvendo-me em nostalgia: “Alô, oi sou eu, por favor não desligue... Escute, estou no telefone de rua, já é tarde e a linha pode cair... Eu tenho apenas três minutos, eu tenho apenas três minutos... Para dizer que não posso viver sem você... Eu tenho apenas três minutos para dizer te amo, te amo, te amo...” A urgência e a paixão dessas palavras ressoavam em todos os que esperavam sua vez na fila, cada um com sua própria história para contar.


Os orelhões, ou TUPs (Telefones de Uso Público), eram abrigos de metal projetados pela talentosa arquiteta e designer sino-brasileira Chu Ming Silveira. Os primeiros protótipos surgiram em 1971, no saguão do edifício sede da Companhia Brasileira de Telecomunicações (CBT), na Rua 7 de Abril, no coração de São Paulo. Em 4 de abril de 1972, os orelhões foram oficialmente lançados, primeiramente no Rio de Janeiro e em São Paulo, transformando a paisagem urbana e a vida cotidiana.


Nos idos da década de 90, durante as férias em Rio Verde, quando ainda residia em São Paulo, costumávamos ir até a Telegoiás para fazer ligações interurbanas. No balcão, solicitávamos a ligação e a atendente nos direcionava a uma cabine específica. Ali, conversávamos, contávamos como estávamos e relatávamos nossas estripulias. Ao finalizar, voltávamos até a atendente para perguntar o valor da ligação.


Hoje, os orelhões desapareceram das ruas, substituídos por celulares e tecnologia digital. Mas as memórias daqueles dias continuam vivas. Quando lembro daqueles momentos, da ansiedade na fila e da emoção de ouvir uma voz querida do outro lado da linha, tudo se resume a três minutos. Eu tenho apenas três minutos para reviver essas lembranças, para sentir novamente a emoção de cada ligação, para lembrar que, por três minutos, eu podia dizer te amo, te amo, te amo. Três minutos que carregam uma eternidade de saudades e sentimentos. Três minutos que, um dia, foram o suficiente para unir corações separados pela distância.

 





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