A inesquecível viagem dos
alunos do Colégio do Sol em 1985 virou lenda entre amigos, casais e histórias
que ainda arrancam risos — e saudade.
Por: Fábio Trancolin
No calendário, marcava 13 de junho de 1985. Era uma noite fria, mas de alma quente. Na porta do Colégio do Sol, em meio a mochilas nas costas e corações acelerados, um grupo de adolescentes embarcava rumo a uma viagem que atravessaria quatro décadas em lembranças: o destino era Lagoa Santa.
A excursão, inicialmente
marcada para a Semana Santa, foi adiada por um bom motivo: o professor Agrest,
querido por todos, precisou cuidar da mãe doente. Ninguém queria ir sem ele.
Era um desses professores que ensinavam além do conteúdo — transmitiam
entusiasmo, amizade e alegria. Decidimos juntos: com Agrest ou nada feito. A
espera valeu a pena.
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Na noite do embarque, alguns já iniciavam a comemoração. Selmo, Manoel e eu passamos em um bar da Presidente Vargas para “esquentar” o clima — e até compramos cigarro Galaxy, “especial para a ocasião”. Coisas da juventude...
A viagem seguiu pela
BR-060 e GO-184 até Lagoa Santa. Ao chegar, a casa alugada era mais uma tapera
do que um abrigo, mas serviu perfeitamente. O frio era cortante, um frio que,
até hoje, nenhum dos presentes conseguiu esquecer — e que só foi enfrentado com
cobertores finos, casacos improvisados e doses generosas de Velho Barreiro. Ao
final, 49 garrafas vazias foram penduradas em uma árvore em frente à casa, como
troféus de resistência juvenil.
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As lembranças são muitas. Aloísio, o Japonês, tentou esconder uma farofa deliciosa feita por Dona Carmem, sua mãe — mas, cercado por mais de vinte esfomeados, teve que repartir. Um batom labial cor-de-rosa, “protetor contra o frio”, foi passado por alguns rapazes desavisados — inclusive pelo motorista. Não saía nem com reza brava. O irmão do Gato, “convidado por carona”, exagerou na cachaça e vomitou bem em cima do precioso casaco de carneiro de Célio. Pense num homem bravo.
Houve também o romance
frustrado do Japonês com uma moça local, que o fez caminhar pela madrugada até
dispensá-lo com um simples "Tchau". Manoel e Selmo, em ato de coragem
ou loucura, resolveram atravessar o Rio Aporé a nado — em pleno junho, com água
gelada de cortar o corpo.
Durante o dia, a lagoa
era quente, mas o vento gelado exigia toalha aberta e amigo por perto ao sair.
Homens e mulheres se revezavam na água ao som de um sino que marcava os turnos
de hora em hora. À noite, todos se reuniam no bar do japonês — o único ponto de
encontro da cidadezinha, que naquela época ainda era um vilarejo pouco
estruturado.
No domingo, 16 de junho,
todos pararam para assistir ao jogo da Seleção nas Eliminatórias da Copa. O
Brasil venceu o Paraguai por 2 a 0, com gols de Casagrande e Zico. Agrest,
flamenguista apaixonado, gritava como Galvão Bueno: “É craque, é gênio!”. Era a
Seleção de Telê Santana, com Zico, Sócrates, Júnior e Falcão. Um time que sabia
jogar — assim como nossa turma sabia viver.
E como se tudo isso já
não bastasse para eternizar a viagem, três casais surgiram daquele fim de
semana: Ailton e Ana Lúcia, Tom Jonas e Lúcia, Manoel e Marta — AA e MM ainda
estão juntos com filhos e netos... Tom Jonas se foi...
Lembramos, sim. E sempre
vamos lembrar. Porque há viagens que não terminam no fim de semana. Existem
memórias que resistem ao tempo — permanecem jovens, vivas, como aquela turma,
aquela noite gelada, a farofa dividida, o batom que marcava bocas e risadas, os
maracujás do Mato Grosso do Sul... A cachaça contada em garrafas penduradas na
árvore... o sino que marcava rodízio, como quem marca capítulos de uma história
que não será esquecida.
Essa era a turma da
excursão. Sinto saudades de cada um. Alguns ainda encontro, outros há muito não
vejo. E três nos deixaram, retornando ao Plano Espiritual: Cigano, Baiano e
Antônio Jonas — mas seguem conosco em cada lembrança.
Estavam lá: Adalto,
Agrest, Ailton, Aloísio (o Japonês), Antônio Jonas, Celestino, Célio, Clayton,
Edno (Baiano), Fábio Trancolin (o contador de histórias), Vilmar (o Gato, de
olhos verdes, o “zoio de gato”), Gerson (Cigano), Jairinho, Manoel, Nilton
César, Odair, Osmar e Selmo... e até o irmão do Gato, que pediu carona até
Itajá, porém, seguiu viagem e ficou por lá... E, entre as meninas: Ana Lúcia,
Aparecida, Márcia, Mariana Emília, Marina, Marta, Lúcia Helena e Zilma.
Quarenta anos depois,
tudo isso continua vivo. Porque certas histórias não passam. Elas permanecem —
como cicatriz bonita, como retrato antigo, como saudade boa.