Já fazia algum tempo que planejava essa visita.
Nesta quinta-feira pela manhã, finalmente bati à porta do meu amigo de longa
data, Dr. Vicente Guerra. Era para
ser apenas um “oi”, daqueles encontros rápidos em meio à rotina corrida, mas
acabou virando horas de boa conversa, dessas que nos fazem esquecer do relógio.
Como diz a máxima: há momentos em que não perdemos tempo, e sim a noção dele.
Aos 90 anos, Vicente mantém a lucidez
admirável de uma mente privilegiada. Nossa amizade atravessa quase meio século,
e reencontrá-lo foi como abrir um livro repleto de histórias — páginas vivas da
memória de Rio Verde.
Natural de Minas
Gerais, ele conheceu a cidade ainda em 1953 e, em 1965, escolheu-a para viver
ao lado da esposa, Dona Neuza, com quem construiu família e criou os filhos:
Flávia, Adriana, Danielle, Fabiana, Vicente Filho e Marcelo.
Entre recordações,
percorremos a Rio Verde dos anos 1970 — uma cidade pequena, de ruas curtas e
limites ainda acanhados, mas pulsando com sonhos de crescimento. Amante dos
esportes, Vicente foi um dos incentivadores para que o município abraçasse
novas modalidades. Até então, predominava o futebol; vôlei, basquete e natação
ainda não faziam parte da rotina da juventude local. Foi por meio de sua
atuação que essas práticas começaram a ser implantadas na cidade.
Atuando também no Lions Clube e junto ao 2º BPM, ajudou a idealizar os
inesquecíveis Jogos Abertos,
quando colégios como Marins Borges, João Veloso do Carmo (Gigantão), Colégio
Agrícola, Frederico Jaime, Colégio do Sol e Aplicação se enfrentavam em quadras
lotadas. Era um tempo em que a Polícia Militar trazia árbitros da capital e
fornecia bolas, redes, troféus e medalhas. Uma época que deixou saudade em toda
uma geração. Ao fundo da memória, ainda se ouvem os gritos da torcida nas
quadras disputadas.
Nossa conversa
também nos levou à Doutrina Espírita,
tema que tanto me inspira. Vicente recordou amigos que colaboraram com a
difusão da caridade na cidade e sua própria atuação solidária, além da
trajetória como médico cardiologista. Relembrei, inclusive, um episódio pessoal:
em 1979, quando quebrei o braço, foi ele quem me atendeu no Hospital Santa
Terezinha.
O tempo passou sem
que percebêssemos. O relógio avançou, mas não importava. Porque não se perde
tempo quando se está diante de alguém que nos é caro; perde-se apenas a noção
dele.
A visita mostrou que
preservar a memória é valorizar a história. Naquela manhã, o tempo passou
despercebido — como se fosse possível resgatar a essência de uma época que
marcou gerações. Ao me despedir, ficou a certeza de que essas conversas não
podem ser adiadas. São encontros que alimentam a memória, fortalecem os laços e
nos lembram de que contar histórias — e ouvir quem tem tanto a compartilhar — é
uma das formas mais bonitas de preservar a vida.