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| Avenida Pauzanes de Carvalho |
Lá pelos idos dos anos 70, a gente costumava
visitar a Madrinha — Dona Maria, esposa do Seu Pauzanes de Carvalho. Madrinha
do meu pai, era uma mulher doce e firme, daquelas que acolhiam com um simples
olhar. E, de alguma forma, todos se sentiam bem perto dela.
Meu pai perdeu a mãe ainda menino, no começo dos
anos 50. Tinha apenas onze anos. Era o caçula dos oito filhos do Seu Henrique e
da Dona Maria Abadia. Foi então que a Madrinha o acolheu — e ele passou um
tempo morando em Goiânia, ainda uma cidade “adolescente”, com ruas de terra e
sonhos por nascer. Lá, dividiu dias, risadas e histórias com os filhos do
Pauzanes — o Lauro e o Mário, irmãos de criação.
As visitas à chácara da Madrinha eram sempre uma
festa. Naquele tempo, o caminho parecia longo — morávamos na parte baixa da
cidade. A sede da fazenda ficava onde ainda resiste a velha casa, no início da
avenida que hoje leva o nome do dono da propriedade. Restam algumas mangueiras,
firmes, silenciosas testemunhas do tempo. Mudou tanto...
Os domingos ali tinham sabor de simplicidade e
alegria. No tempo das mangas, o mangueiral virava um banquete — o chão coberto
de frutos, o ar doce, e a meninada correndo entre os galhos. Ao redor, o
cerrado — verde, vasto, cheio de vida e lembranças. Às vezes, ainda parece que
o cheiro da manga madura volta de repente, trazendo junto o perfume do tempo
que ficou.
O mundo era outro. O ônibus da Asa Verde parava no
armazém do Chiquinho — ponto certo dos viajantes. Lembro bem daquele lugar, com
cheiro de querosene e café torrado, cordas de bacalhau, rolos de fumo, varas de
pescar... tudo o que um roceiro precisava. No ar, misturavam-se os aromas de
peixe frito, torresmo e salgados — aquele perfume inconfundível do armazém de
alguém, cheiro de interior...
A
jardineira branca e verde seguia estrada afora, rumo a Montividiu, Caiapônia,
Iporá, Amorinópolis e às fazendas lá pelas bandas do Caiapó. Ia deixando para
trás o casario simples e a poeira da cidade, sumindo no horizonte, lá na curva
do Segredão. Só nos idos da década de 90 é que o asfalto chegou à Pauzanes Carvalho —
selando, de vez, o fim daquela paisagem de terra vermelha e caminhos de
infância.
Tudo mudou. Mas, quando fecho os olhos, ainda ouço
o ronco da Asa Verde, sinto o perfume das mangas maduras e vejo, ao longe, a
casa branca da Madrinha — guardiã de um tempo bonito, simples e inesquecível.

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