Algo faz bem à alma quando vejo fotos antigas. Elas despertam um ar nostálgico, e eu sou, confesso, um nostálgico por natureza. Faz parte de mim. A foto em questão nem é do meu tempo — vem de um passado mais distante. Meu pai viveu essa época. Fez parte desse cenário, caminhou por essas mesmas paragens e me contava como era...

O meu tempo por ali começou no início da década de 70. Ainda peguei as ruas de cascalho, quando o asfalto era promessa. Algumas daquelas árvores ainda vi de pé — o jenipapo da descida da 12 de Outubro fez sombra sobre a minha infância. Os casarões da Rua Senador Martins Borges eu conheci. Muitas vezes passei em suas portas, e cheguei a entrar em seus quintais. Na descida da 12, morei num deles — aquele de portas e janelas vermelhas.


Cascalho, assoalho, terra vermelha... Quintais floridos e cheios de árvores frutíferas: goiaba, jabuticaba, manga, ameixa e cereja... tamarindo, cajá, caju e jatobá. Na janela, o patuá balançava preso à tramela. No jirau, a massa de pão descansava na gamela.

O aroma do café se misturava ao cheiro de bolinho de polvilho e ao doce no tacho, que a doceira mexia com cuidado. As ruas antigas... as mongubeiras exalando seu perfume no cair da tarde... vagalumes e pirilampos dançando no ar, um desfile de luzes miúdas e encantadas. O rego d’água escorria da nascente, limpa e generosa.


Era o tempo das portas abertas, quando os vizinhos iam e vinham sem cerimônia — O compadre — A comadre! Deus te abençoe, na resposta das crianças, quando pediam “bença” aos mais velhos ao chegar!  E sempre havia café “medroso” servido — pois, sempre vinha acompanhado de iguarias, de prosa boa e de risadas francas. Ah, que saudade da rua de outrora... Do amanhecer dourado ao entardecer pintado de laranja, do violão que embalava serestas sob o luar, da natureza em festa — tudo parecia cantar.

O verde tomava conta das calçadas de terra batida, dos portões baixos e muros simples. A luz fraca do poste de madeira mal iluminava a noite dos curiangos em voo baixo. Saudades... tantas saudades... Da moça na janela de madeira, observando o vai e vem tranquilo da rua, como quem assiste o tempo passar — devagar, bonito e sereno, como era a vida naquele lugar.