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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

O campo de aviação






Henrique Nogueira Duarte abastecendo avião década de 40

As histórias do início do aeroporto sempre ouvi na minha casa, elas sempre fizeram parte da minha família. Meu pai nasceu lá, não onde está hoje, mas onde se localiza o Parque de Exposição, ali era o campo de aviação chamado de Aeroclube de Rio Verde. Que teve como presidente e sócio fundador Epaminondas Portilho (Nego Portilho), João Ford era o mecânico dos aviões e piloto. No dia que o pai nasceu, caiu um avião no quintal da casa dos meus avós e derrubou um pé de limão, ninguém morreu, pilotavam um “Paulistinha” o instrutor e uma aluna. Henrique Nogueira Duarte (Meu avô) era o “guarda campo” e responsável pela manutenção do aeroporto, ele zelava e cuidava de tudo por lá, juntamente com a minha avó Dª Maria Abadia.




Meu pai conta que a mãe dele era uma daquelas pessoas que fazia de tudo e estava sempre disposta, ela acordava muito cedo e fazia as quitandas e também para “abater” as encomendas dos tripulantes dos aviões da Nacional Transporte Aéreo que passavam por aqui naquela época. Essas encomendas eram galinhas caipiras, meu avô saía de carroça comprando os galináceos pela região, em média eram de 15 a 20, minha avó levantava muito cedo, e o fogo ela deixava aceso antes de dormir, e quando levantava antes das 04:00 h, o tacho estava com a água fervendo, ela fazia o serviço e, quando o avião que ia pra o Rio de Janeiro passava 08:30 h, estava tudo preparado, e às 10:30 h, vinha o que iria para São Paulo.  O pai conta que as aterrissagens desses aviões eram “festa” na casa dele, num tempo em que a população de Rio Verde não tinha acesso à maçã e banana nanica, na casa dos meus avós essas iguarias faziam parte do cardápio. E, pão de forma e “mussarela” também eram outras coisas que sempre tinham por lá, e eram desconhecidas pela maioria. Eram oferecidas com lanche nas aeronaves e a tripulação presenteava os meus parentes.        




No período em que Jerônimo Martins foi prefeito de Rio Verde, houve uma desavença com o meu avô e ele foi proibido de entrar no aeroporto, com a chegada de Astolfo Leão Borges ”Bebé Borges” em 1951 ao poder, as coisas mudaram e ele pode voltar a exercer as funções. Minha avó desencarnou no dia 04 de dezembro de 1952 e, mesmo viúvo, o ‘Henriquinho’ ficou no aeroporto, o meu pai era o último filho na escala de oito filhos, nesse tempo, ele tinha 11 anos e, então ele foi morar em Goiânia na casa da Madrinha Dona Maria Silveira esposa de Pauzanes de Carvalho, naquela época, a capital do estado era uma ‘adolescente’ tinha apenas 18 anos.    




Mesmo com o retorno da minha avó para o Plano Espiritual, o meu avô ficou por uns anos no aeroporto e deixou a função em 1957, ele foi para São Paulo, ele sempre gostou muito de loterias, e vendia bilhetes, essa foi uma marca registrada dele, depois, retornou para Rio Verde, era uma figura conhecida e muito querida. O ex-prefeito Lauro Martins quando ganhou o primeiro prêmio na Loteria Estadual, foi o Seu Henriquinho que lhe vendeu o bilhete, e muitos outros tiveram a sorte através do meu avô. Na década de 70, outro “Nogueira Duarte” assumiu o cargo que fora outrora do meu avô, meu tio Anaetes morou por um tempo no aeroporto.
 
Primeira turma de pilotos do Aeroclube de Rio Verde 30/12/1941

E, nos finais de tarde na estradinha de areia, lá íamos nós rumo ao por do sol nos “fusquinhas” branco, azul que o pai teve naquela época. Subíamos a estrada de “areião” que começava logo depois da ponte do córrego do sapo e passava na porta do Clube Campestre, ali terminava a cidade, era cerrado preservado. Na porta da casa do meu tio, tinha um pé de Jatobá, era diversão para as crianças, ele era pai de três meninas, e um tanto quanto sistemático e, na minha casa, três meninos, ele não gostava muito da ideia de brincarmos com as primas, mas era um período de ingenuidade, mas ele não via assim, dizia ele “menino pra lá, menina pra cá”. A casa era de chão batido e cercado de pau-a-pique, e de uma limpeza de causar inveja a muitas casas de cimento e paredes, os utensílios domésticos de tão limpo brilhavam que o rosto refletia no fundo da panela. 


Móises e a Professora Olga Nascimento (casal)

Era festa ver os aviões subirem e descerem na pista ao longe que era circundando pelo cerrado conservado. Na época dos cajuzinhos, o povo invadia o campo cheiroso num final de tarde na cata do fruto delicioso no tom amarelo e vermelho que enchia as latas, as gabirobas e as pitangas enchiam a mão da molecada, que corriam no meio das árvores retorcidas num abraço da mãe natureza. E, assim, o aeroporto fez parte da minha infância.




Foi apresentado um projeto na Câmara Municipal para que em homenagem ao meu avô Henrique Nogueira Duarte, então esse seria o nome do aeroporto de Rio Verde, o projeto foi arquivado. Mas quem conhece a história e sabe do carinho que o meu avô tinha por aquele pedacinho de terra e o tanto que ele fez por aquele lugar, essa seria a grande homenagem. “CAMPO DE AVIAÇÃO HENRIQUE NOGUEIRA DUARTE”.







Mala velha





quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Um estabelecimento chamado ‘Pregão’


Fábio Trancolin


Em São Paulo, no Bairro da Santa Cecília existe o comércio de móveis usados conhecido como “Lixão”, nesse local encontram peças raras e a beleza da decoração, o que para uns é velharia para outros é pura arte. Esse comércio é antigo e uma prática muito utilizada. Em 1978 o pai em parceria com um ‘amigo’ resolveram colocar o comércio de móveis usados em Rio Verde, e denominaram de Pregão (o pai foi o primeiro na cidade). Os moldes seria no mesmo da Santa Cecília, só que aqui não tinha muita arte, eram mais utensílios domésticos, que as pessoas por vários motivos descartavam e vendiam.

O Pregão foi instalado na Rua Costa Gomes, 617 (hoje é a Divipiso). E foi decidido que além de ter os móveis usados, também, teria móveis novos que o pai fazia, ele era exímio marceneiro fabricava as famosas salas de jantar, que a alta sociedade da época adorava e muitos colocaram em suas casas a beleza da arte da madeira, alguns ainda conservam em suas residências essas peças. O comércio foi aumentando e melhorando, tinha de tudo ali amontoado. E descartavam de tudo, o que para uns era empecilho, para outros era luxo. E tinha os que vendiam pela necessidade, muitos viam vender e desfazer de bens, às vezes, para comprar remédios, enterros, pagar as contas e até comer. Esse era um ponto que desagradava o pai, ver pessoas se desfazerem dos móveis para isso. 

                                                                                          Foto ilustrativa
A ‘loja’ prosperava, porém um dia o ‘sócio amigo da onça’ do pai, fugiu, escafedeu, desapareceu... Deram notícias de que ele tinha adquirido uma Brasília Zero Km, e simplesmente foi embora, o dinheiro da aquisição do carro, imagina de onde ele tirou... Assim o ‘pregão’ ficou no prego, e baixou as portas. Então o pai teve outra sociedade, abriu outro, dessa vez o endereço era na esquina da Augusta Bastos com a Laudemiro Bueno (hoje é a Papelaria Faria/Portinari). O pai cuidava da marcenaria e o sócio da tapeçaria, esse no tempo em que esteve aberto foi muito bem, porém por falta de tempo na dedicação do empreendimento, ele fechou mesmo sendo um sucesso, bons tempos aqueles.

O pai fez outra tentativa dessa vez em frente ao Colégio do Sol, na Rua Goiânia, o sócio foi um sobrinho, o Hélio, as entregas eram feitas numa carroça, porém o cavalo sumia umas duas vezes por semana, coincidência ou não, todas as vezes quem encontrava o ‘fujão’ era sempre o mesmo cigano, e tinha que dar uma recompensa para ele... A última tentativa foi com outro sobrinho o Hélcio, dessa vez foi no Bairro Popular, na Rua 19, hoje o espaço é utilizado pelo Supermercado Economia, que naquela época era apenas o Armazém do Seu João, era uma parte da cidade carente e esquecida no inicio da década de 80, era chamado de forma pejorativa de ‘Vilinha’, bairro distante e que sofria certa rejeição da parte central da cidade. Hoje, o Bairro Popular é independente valorizado e comércio forte.

No final da década de 70, meu pai idealizou e não prosperou, então ele preferiu só fabricar móveis para os pregões da região que começavam a propagar, nós vendíamos camas, mesas e cadeiras, e as cantoneiras (usava-se muito naqueles tempos para colocar o filtro, hoje nem sei se utiliza mais...) para Santa Helena e Quirinópolis, a marcenaria fabricava a semana toda e na sexta ou sábado eles viam buscar a produção da semana. Isso durou até 86.

                                                                         Foto ilustrativa: Torno Invicta
No início de 87, eu coloquei fim na marcenaria vendendo a última máquina, a derradeira peça a nos deixar foi o Torno Invicta. Tínhamos a Circular, a Furadeira, a Tupia e a Plaina, e todas elas foram vendidas para o Orlando. O torno era especial, ele muito nos ajudou, nos períodos difíceis ele sempre nos amparou. Quantas e quantas peças o meu irmão torneou, esse trabalho fez dinheiro que chegava em momentos complicados, e sempre tinha algo para o formão desbastar. Recordo-me no momento em que fechei negócio com o Orlando, entregando-lhe a máquina e recebendo Cr$ 30,000, quantia insignificante para o valor que ele tinha...  Ali finalizava a marcenaria que nos proporcionou estudos, alimentação e tudo mais... O cheiro da cerejeira, da peroba rosa, do jatobá, a serragem acumular, o verniz e da cola ‘fórmica’ invadia as narinas... O sonho de madeira acabou e o cheiro ficou na lembrança de menino que foi criado no meio da arte do entalho e do retoque da lustração. 


segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Desejo - (Poema Victor Hugo)




quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Nas estradas que levam ao caminho do sertão.


Fábio Trancolin


O pensamento foi longe e de tão longe me levou ao ver dois moleques de 15 e 16 anos com mochilas nas costas numa estradinha de poeira vermelha, e o cerrado com cheiro característico do amanhecer. “Eu vou voltar pro meu cerrado”, e embalar num cheiro do passado a caminho das terras lá pra bandas do “rasgado”. Certo dia, eu e o Jairinho resolvemos que iríamos para a fazenda onde morava Sebastião Fagundes, mais conhecido por “Tião Catira”. Ela ficava lá para os lados do Ribeirão do meio, sentido a esquerda depois do aeroporto. Saímos de casa cedo, e colocamos o pé na estrada, mais ou menos estilo Renato Teixeira, “amanheceu, peguei a sacola e fui viajar”. A ideia era pegar carona, chegamos no acesso a GO 174 sentido Caçu, e até ali nada, só a pé. Pra chegar na fazenda, tínhamos que andar quase uns 30 km, passou uma caminhonete e nos deu carona até determinado ponto, foi pouco, mas já ajudou. E a maior parte de percurso foi feito na sola mesmo.


Chegamos à roça, mortos de fome, levamos mochilas, porém mantimentos nada. Mas, isso era o de menos, o importante era estar lá. Na casa, morava o Tião, a mulher dele a Carminda e, o Tiãozinho o cunhado, e o filho Ruiter. Lá ele era o caseiro, o vaqueiro, o faz de tudo. Tião era um sujeito boa praça, tinha várias histórias a seu respeito, diziam que ele que fazia a suas próprias espingardas e colocava o cunhado para experimentar, mas antes tomava o cuidado de se proteger (vai que o experimento não dá certo). Tião, também, era um sujeito nervoso perdia a paciência muito fácil; tirando leite, se a vaca não ficasse quieta ele mordia na orelha dela... Era uma “figura”, deixou saudades. Por muito tempo, trabalhou nas terras do Iron Ferreira. E onde ele morava ao fundo se ouvia a cachoeira do Rio do Peixe, lugar bom de pescar. E por falar em pescaria logo fomos preparar as tralhas.


Todo dia tinha pescaria no ribeirão que dava nome ao lugar, “Córrego rasgado”, quantas traíras, lambaris e ‘lobós’ fisgamos... Certo dia, resolvemos que iríamos pescar na cachoeira, e fomos, para atravessar para o outro lado onde tinha o melhor ponto, o único apoio era um arame amarrado de um lado ao outro, hoje paro pra pensar como é que eu fiz aquilo, atravessar na correnteza e quase ser levado rio abaixo, sem noção, loucura, Mas, fizemos e valeu a pena, a pescaria foi satisfatória.

Mas, não era só peixe, o fogão, a lenha sempre tinha algo diferente, comida na roça e “trem bão dimais”. E, uma noite, o Sebastião foi à caça, pegou a cartucheira e saiu, antes deixou um recado, quando ouvir o tiro mulher, põe a água pra ferver. Então tá, pode deixar disse ela. Passando um tempo, ouve-se o estampido, e o Jairinho falou pra Carminda, então? Ela disse, vamos esperar... Passou um tempo, entra o Tião “nervoso” e joga um ratão do mato no chão, “matei essa disgraça escutei mexer no milho, liguei a lanterna e atirei, mas num era paca, foi isso que eu matei”. Isso virou piada...


Uns dois dias depois, lá vai o Tião de novo com espingarda nas costas, mas, dessa vez não teve aviso. Demorou, então ouvimos os disparos, será? Passado um tempo lá vem o homem, todo orgulhoso com dois tatus, um o tiro estraçalhou não teve como aproveitar, o outro virou farofa. Ficamos por lá uns 15 dias. A casa de pau a pique, de lugar agradável, e de muitas histórias de mentiroso ao redor do fogão, ouviram por lá. 


A estradinha das pitangas, gabirobas e dos pés de pequis, e do belo entardecer do cerrado, ao som do jaó, perdiz e inambu, seriema ao longe cantou, carcará no pau a observar o chocalho da cascavel no balançar dos guizos no seu som a assustar. Tatupeba e bola, lobo-guará, as cotias e pacas que na noite que vem vindo, elas saem a espiar. Os tamanduás e os campeiros com medo se escondem nas árvores retorcidas que os protegem (protegiam). As pintadas e tantas histórias das zagaias que atravessaram as belas pintas. E você que lembrou e chorou, eu também choro. Choro por tudo que nós tivemos e hoje só lembrança deixou. E seria tão bom permanecer nessa estrada... Nas estradinhas que levam ao caminho do sertão.




sábado, 8 de fevereiro de 2014

Desiderata





segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

As lembranças da campanha que não ganhamos


Fábio Trancolin

Ano eleitoral de 1986, ano de mudanças no governo estadual, e a troca nas cadeiras da Assembleia Legislativa, no Congresso e Senado, para presidente ainda não tinha chegado o momento, teríamos que esperar um tempo ainda. Já trabalhei em eleições assim, eram outros tempos, não existiam os marqueteiros, e eleição se fazia no corpo a corpo, em carroceria de caminhão e muita sola de sapato gasta na poeira do chão batido.


Eu estava desempregado, a campanha já tinha começado. Então, meu pai falou com o Isaac Portilho que era o presidente da Câmara de vereadores e um dos coordenadores da campanha, para ver se ele achava algo para eu fazer. Ele muito amigo da nossa família, pediu que procurasse o vereador Luiz Alberto Leão (Hoje ele dá nome à escola onde a minha filha estuda e o meu filho estudou, justa homenagem ao bom amigo professor), e assim eu fiz, o comitê da campanha ficava ali em frente à Comigo, hoje é a Credi Rural. Chegando lá, me identifiquei e sabendo quem me recomendou, no mesmo momento, eu fui contratado. O comitê era movimentado, muito entra e sai, naquele tempo podia oferecer de tudo numa campanha, não tinha fiscalização e o povo pedia de tudo, de documentos a dentadura, material de construção, cesta básica, remédios, consulta, passagem, enterro, dinheiro e pinga... Ali era um ponto de distribuição de favores em busca do apoio nas urnas do dia 15 de novembro (Naquela época a eleição era no dia da Proclamação da República). 

Estávamos em agosto, tínhamos um longo período de campanha pela frente. A minha função não tinha sido definida, saímos para fazer campanha nos bairros, distribuindo cartazes e “santinhos” nas residências, mas isso durou pouco. Foi montada uma equipe para viajar e um dos coordenadores disse que queria contar comigo na equipe dele. E assim foi feito. Esse cidadão era Iudes Pacheco, ele escolheu quem iria fazer parte da turma, Renilton (Rei), Jerry Adriani, Divino Eterno (Terninho), Sodino como motorista, e foi nos dado uma Caravan verde, naquele tempo não tinha plotagem, tudo era escrito a mão pelos pintores letreiros, o Bosco era um deles. A Caravan ficou pronta, éramos a turma direta do candidato a Deputado Estadual Carlos Cunha (PDC) 17137, ele o vice-prefeito e se lançava a uma vaga na Assembleia, na mesma chapa, tínhamos o candidato a Deputado Federal Paulo Roberto Cunha (PDC) 1701, que colocava o nome pela primeira vez à disposição das urnas, líder classista respeitado no meio agrícola e cooperativista, os candidatos majoritários eram Wolney Siqueira (PFL) 2501 e Moises Abraão (PDC) 171, candidatos a uma vaga ao Senado, todos faziam parte do Movimento Democrático Goiano (MDG) que apoiavam o nome para o candidato ao governo do estado Mauro Borges (PDC) 17. E também tinha o Paulo Reis candidato do PDS, dele eu não me lembro do número.

Caravan - Foto ilustrativa
A primeira viagem daquela turma foi para Castelândia, teria um comício naquela cidade, e a nossa função era ir antes, colocar faixas e placas (essas placas eram de lata perfurada por um arame que colocávamos amarradas no alto dos postes, sempre respeitando a hierarquia da campanha, Governo, Senadores, e Dep. Fed. e Dep. Est.). Tínhamos que fazer o fogareiro para o grude (água e polvilho mexia até engrossar) para colar cartazes, isso demorava certo tempo, mas, nos foi ensinado pela turma que fazia a campanha do Wolney, que não era necessário esquentar, bastava colocar soda na água e mexer que virava cola, produto perigoso que deixou cicatrizes em alguns. Estávamos fazendo o nosso trabalho, eu em cima de uma escada pregando placa, quando um dos amigos disse pula... Perguntei, o quê? Pula, tinha um cidadão com um revólver engatilhado em nossa direção, o jeito foi correr... Muitas vezes, tivemos que fazer isso (correr), naquela época campanha era feita assim (à bala)... Certa vez, no município de Santo Antônio da Barra, estávamos colocando placas, quando apareceu um jovem, ele estava com o teor etílico acima da conta, e entrou no meio da turma, falando um monte de besteiras e tirando sarro do adversário, e queria porque queria subir na escada e colocar a placa, o dono do bar a tudo assistia e não falava nada, mas a cara era de poucos amigos, assim que saímos e o rapaz alcoolizado ficou sozinho, o cidadão simplesmente disparou quatro tiros à queima roupa e matando aquele que nada lhe fez de mal, apenas fez comentários ao candidato concorrente. O Prefeito de Rio Verde Osório Santa Cruz que era um dos articuladores da campanha na região cancelou o churrasco, perdeu a graça, não tínhamos mais nada a fazer ali. 

As viagens continuaram, o Sodino saiu, ele desentendeu com o Pacheco, agora éramos apenas cinco na Caravan. Quase todos os dias tinha viagem, estávamos sempre nas estradas, cansativo, mas eu adorava viajar. O candidato nos dava uma cota em dinheiro para alimentação e hospedagem, mas, o Pacheco fez um acordo, almoçaríamos mais tarde, e o resto da verba ficava para cerveja, o cigarro para aqueles que fumavam, o candidato disponibilizava, eu era um deles, ele comprava Hollywood e repassava pra gente, não gostava de cigarro forte. 

Tínhamos sempre as mesmas cidades para percorrer, Acreúna, Paraúna, Santo Antônio da Barra, Montividiu, Maurilândia, Castelândia, Indiara, Edéia e Santa Helena, essas eram as cidades que estavam no nosso roteiro. Cada uma delas teve uma história, engraçada, marcante e trágica, já falei sobre duas delas. Em Acreúna estive lá na inauguração da praça central, grande comício, as rachadas também eram por nossa conta, nós é que fazíamos, em duas ripas colocávamos os rojões, pregávamos, e depois ajeitava no local e era só esperar o combinado com o Pedro ‘Zoiudo’ para passarmos a gasolina e colocar fogo. E por falar no Pedro, ele era o locutor da campanha, a frase ‘Tá certo Paulo Roberto’ foi criada por ele, era uma figura, muitas histórias o ‘Zoiudo’ deixou. Nesse comício, aconteceu algo inusitado, a equipe do Paulo Roberto montou a rachada, a deles tinha que ser a melhor que a dos demais candidatos, (simplesmente ostentação e arrogância) ela foi colocada próxima a do candidato à vice Alcides, que iria falar antes do Paulo, aconteceu um incidente a chama da rachada dele espalhou e atingiu a do PRC, foram tantos fogos quase que o Alcides não falou, os fogos não paravam, parecia virada de ano, a turma do Paulo entrou em desespero, e a rachada do patrão foi para o espaço. Pediram para que cedêssemos a nossa, recusamos, não gostávamos de alguns deles, fizeram um ‘mutirãozinho’ e improvisaram um barulho. Divertimo-nos com a situação. 





Numa noite, teve um comício no Parque Bandeirante e de lá saímos em direção a Maurilândia, naquela noite, ninguém dormiu, fomos direto, passamos a noite toda pregando cartaz e preparando a cidade para o dia seguinte, o candidato ao governo faria um comício ali à tarde. Depois do serviço pronto, alguém nos avisou que pessoas ligadas ao candidato do outro lado tinham arrancado e desfeito todo o trabalho que fizemos a noite toda. E, na porta de uma loja de eletrodomésticos, os dois lados se encontraram, começou uma discussão, que logo virou briga, foi porrada pra tudo que era lado, eu vi que o Pacheco estava no meio, fui na intenção de tirar ele, porém, nesse momento, alguém, com um grampeador (era um dos grandes), acertou a cabeça do cidadão que começou a briga, foi sangue pra tudo que era lado e ele tombou desmaiado, foi no exato momento em que eu levei um chute, eu revidei, e deu a entender que foi eu quem acertou o cara com o grampeador. E quando eu saía do meio da confusão, alguém me disse, no ouvido, “você acertou o Tião, você não sai vivo daqui”...  Pensei, ferrou e agora? Eu era apontando por onde passava, e comecei a ficar preocupado com aquela situação, não queria subir mais em escada, pois era alvo fácil, quando o Carlos Cunha chegou, avisei para ele, que eu queria ir embora, pois o negócio estava ficando feio, ele chamou a policia e onde eu estava, tinha sempre um soldado ao meu lado (já tive guarda-costas), no final, deu tudo certo, o Roni Cardoso cantou, animou o comício e a paz reinou... 

Santa Helena, foi a cidade que mais visitamos, ficávamos sempre no Hotel do japonês, o João Asa, ali a comida era farta, era piada na hora do almoço, o Japa dizendo, quer mais “birifu?”. Foi ali que passei o meu aniversário de 18 anos, todos eles sabiam do meu dia, porém ninguém falava nada, no café da manhã, nada, saíamos e todos calados, na hora do almoço, me chamaram no quarto e ao entrar tive uma surpresa, me deram um banho com um balde cheio de cerveja, foi uma festa. Depois do comício, resolvemos que íamos comemorar o meu aniversário no Bar Samambaia (Bar que ficava na esquina da Costa Comes e Afonso Ferreira), porém na hora de voltar, um cidadão, que nos deu um trabalho danado naquele dia, ele se alojou na Caravan, e disse que não sairia dali, e ninguém conseguiu tirar, ele era complicado. Pedro ‘Zoiudo’, disse, ‘Fabinho, vem, você vai comigo, deixa esse “viado...” E, voltamos num Fiat, o tecladista da banda e mais um cara que pediu carona, e na estrada o motorista no trevo da BR 452 passou direto e quando vimos, estávamos atravessado, o carro apagou e, nesse momento só, ouvimos a buzina de uma carreta que vinha em alta velocidade na nossa direção, um olhou para o outro, e só ouvimos, “reza que chegou a hora”, o motorista conseguiu desviar do 147 e só sentimos o deslocamento de ar... Experiência horrorosa... Ao chegar em Rio Verde, me deixaram em casa e não fui comemorar o meu aniversario, mas eles foram... E amanheceram no “Samambaia”... 

No mesmo quarto que comemorei o meu aniversário, tempos depois eu ardia em febre, ela passou dos 40, noite de chuva forte, o comício foi cancelado, e eu passando mal, muito mal, tanto é que o Carlos ficou nervoso com o Iudes por me levar numa situação daquelas, deu-lhe uma bronca e chamou o filho dele o Marcelo e pediu que me levasse para casa, assim voltamos, chovia tanto que não se via nada, e mesmo ruim, eu falei para o Marcelo, tem alguma coisa na frente, e ele não tinha visto, um caminhão parado sobre a ponte do São Tomás, nós iríamos “afundar” a traseira do “brutu”. Ele me deixou em casa e, no dia seguinte, fui encaminhado para o Doutor Carlos Costacurta, constatado pneumonia, e o médico disse para o pai, que eu era muito magrinho, estava muito debilitado e iria fazer o possível... Ele quase mata é o meu pai. Escapei... Pior foi o que estava escrito no papel que foi entregue na recepção, era encaminhamento de campanha, eu fui todo ‘arrumadinho’ só li depois “Caro amigo Doutor... Auxilie essa pessoa que é necessitada e não tem condições financeiras e precisa de ajuda”.  Ainda voltei para o final da campanha, fiquei chateado, pois no período que fiquei fora, eles foram para a Lagoa Santa e eu não participei dessa rota da viagem...

A campanha se aproximava do fim, muitos quilômetros rodados, várias foram as vezes que voltamos de madrugada, exaustos, no meio da estrada, muitas vezes, o Iudes pedia que cantássemos para que ninguém dormisse, quantos foguetes soltaram no meio da noite para espantar o sono... Dia 12 de novembro era o limite da propaganda eleitoral, e o último comício foi realizado na cidade de Edéia. A última rachada foi montada, e ela foi colocada no fundo do comitê e, por infelicidade, a moradora do lado era adversária politica, ao estourar vários foguetes bateram na mangueira e caíram no quintal da vizinha, ela fez um escândalo dizendo que aquilo foi de propósito, e que foi por querer, a cidadã chamou a polícia, depois de muito bate boca, e acusações fomos liberados, e fomos embora. E, ao passar por Indiara, decidimos que iríamos tomar umas cervejas, paramos e ao descermos, percebemos que no bar tinha uma festa do partido contrário. E para não mostrar medo, entramos. A situação parecia que iria ficar tensa, nossa presença estava incomodando, então resolvemos ir embora. Quando entramos no carro, o Pacheco pediu que acendêssemos os cigarros e pegássemos os foguetes que sobraram. Miramos rumo ao bar, e a rachada disparada... Só víamos fumaça e gritaria, nunca soubemos o que aconteceu...

O nosso candidato não foi eleito, os majoritários também não, o Paulo Roberto teve a cadeira garantida no Congresso e o Paulo Reis foi para a Assembleia, porém não terminou o mandato, faleceu em 89. E, em eleição é assim, ganhou, amparado está, perdeu, esquecido foi. Mas, os bons amigos ficaram e serão lembrados na história contada. E foram muitas histórias, que é melhor guardar na memória e não contar...