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segunda-feira, 18 de agosto de 2025

Entre esquinas e lembranças, São Paulo em passos de saudade.


 




Às vezes me pego mergulhado em lembranças. Hoje, revi a mim mesmo, antes dos 20 anos, caminhando pelas ruas de São Paulo. Havia uma beleza única em andar pela cidade — cada esquina era uma descoberta, cada rua, um convite. Meu retorno ao grande centro me revelava novos lugares, novas possibilidades. Eram descobertas constantes: sensações, paisagens, emoções. A São Paulo do fim dos anos 80 tinha suas próprias magias.

Lembro-me de passar pelo lado direito da Rua Direita… As chuvas repentinas, o frio inesperado que insistia em aparecer. A jaqueta de couro, o All Star nos pés, os cigarros Free no bolso — marcas de uma identidade em construção. E ecoava em mim a voz de Belchior: “Eu sou apenas um rapaz latino-americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior...” (Rio Verde, Goiás…).

A Bela Vista pulsava em cafés nas esquinas, padarias com aromas que chamavam de longe. Conversas intermináveis na calçada da Enéas, madrugada adentro, sem pressa de ver o tempo passar. As ladeiras que pareciam não ter fim, a espera no ponto da Maria Carlota, da Radial, da Marginal… A Tobiaras na Esperança no sobe e desce e o número nunca aparece, essa expressão também valia para a  Embiruçu... A banca de jornal era um templo: livros, discos, revistas, pequenas janelas para o mundo. E os shows no coreto, no vão livre, faziam o coração acelerar ao compasso da cidade.

O cheiro da feira, de terça a domingo, era um espetáculo à parte: o peixeiro, o bucheiro, as bugigangas e quinquilharias. Frutas em abundância — pêssegos, limões, caquis, mamões, laranjas, mexericas, bananas, nectarinas. E, claro, o pastel de feira, sempre especial, de preferência o de pizza. Lembro até hoje do aroma: inconfundível, inesquecível. O chope na Deliciosa, o pão na Requinte, a baguete com sardela… pequenos rituais da juventude.

A Paulista acendia seus faróis, anunciando a chegada da noite. A Ipiranga, no cruzar das esquinas, era o ponto onde a história se misturava à rotina. Eu, do vidro do ônibus na Amador ou na pressa do metrô, observava a vida passar diante dos olhos, no vai e vem dos desconhecidos. E havia também a menina bonita do último banco do ônibus A.E. Carvalho/República, que eu esperava na Itinguçu só para vê-la… O tempo seguiu o seu curso, mas a vontade de voltar àqueles dias nunca me deixou.

 

 





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