Houve um tempo em que o Natal
começava muito antes do dia 25. Começava nas vitrines. Começava no centro da
cidade, quando as ruas ficavam mais cheias, as luzes piscavam de um jeito quase
tímido, e o cheiro de castanha, pipoca e perfume barato se misturava no ar. Ir
às lojas de departamento não era apenas comprar — era viver o Natal. Tínhamos
as nossas lojas para passear pelos corredores, lojas que hoje já não existem.
Fecharam as portas, desapareceram do mapa, mas não do imaginário das festas de
fim de ano. Sumiram fisicamente, é verdade, mas ficaram guardadas na memória.
As Lojas Brasileiras, a velha
Lobras, tinham esse poder de encantar. Caminhei muitas vezes por suas
prateleiras: brinquedos empilhados, roupas dobradas com cuidado,
eletrodomésticos reluzindo sob a luz branca. Tudo parecia promessa — de um ano
melhor, do presente certo, do sorriso garantido na noite de Natal.
A Mesbla, aquela que “vendia de
tudo, só não vendia caixão”, dominava quarteirões inteiros. Era mais do que uma
loja: era um mundo. Também estive em seus corredores, nos provadores, naquele
vai-e-vem constante que fazia parte do ritual natalino.
A Mappin, com suas vitrines de
vidro e loja monumental, transformava o simples ato de olhar em espetáculo.
“Mappin! Venha correndo! Mappin chegou a hora! É a liquidação!” Tive o cartão
Mappin verde na carteira. Quantas vezes subi e desci seus andares, percorri
seus departamentos… Quantos discos, perfumes e utilidades comprei na Praça
Ramos. Sempre admirava o relógio. Passava por ali vindo do lado direito da Rua
Direita, quase como um gesto automático, um hábito que fazia parte da cidade e
da vida.
A Arapuã fazia o coração bater
mais forte com televisões, rádios e geladeiras — símbolos de progresso dentro
de casa. Também comprei ali, no carnê, como se fazia. O Jumbo Eletro trazia o
futuro em forma de eletrodoméstico. Em 1986, no ano em que completei 18 anos,
em Rio Verde, o Minibox da rede tentou implantar o cartão Jumbo Eletro na
cidade. Cadastrei várias pessoas. Na loja da Avenida Presidente Vargas, os
eletrodomésticos ficavam no piso superior; embaixo, o supermercado. Não durou
muito. Logo a marca foi embora. Outros tempos.
Em Rio Verde, também tivemos
lojas que se foram, mas que deixaram profundamente marcado o encanto do Natal.
Caminhei por seus corredores, encantei-me com as vitrines e dali vieram muitos
dos meus presentes natalinos. A Casa da Louças era um verdadeiro mundo mágico,
um território de sonhos de criança. Havia de tudo para presentear, e inúmeros
de seus embrulhos fizeram parte das noites de Natal de tantas famílias. Seu
fechamento foi trágico, após um incêndio nos idos dos anos 2000, restando
apenas a memória e as lembranças. Ainda guardo, como relíquia, os carrinhos do
autorama do Natal de 1974.
A Gigante do Lar, na Avenida
Presidente Vargas, também era ponto certo nas épocas natalinas. Bicicletas, utilidades
e sonhos cuidadosamente embalados para presente. Na fachada, uma iluminação
especial chamava a atenção: uma grande árvore de Natal que iluminava a avenida
e o imaginário de quem por ali passava. De ambas, restaram os prédios — que,
para quem viveu aquele tempo, ainda evocam saudade e emoção. Obrigado, Ernesto
e Raméz, por fazerem parte dessas memórias.
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| Casa das Louças - Rua Costa Gomes |
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| Gigante do Lar - Av. Presidente Vargas |
As lojas eram templos do
consumo, é verdade, mas também da esperança. Investiam nas campanhas de fim de
ano, sobretudo no Natal, porque sabiam: ali se decidia mais do que uma compra.
Decidia-se um gesto de amor, um sacrifício silencioso, um simples e profundo
“eu pensei em você”. Com o tempo, o mundo mudou. Uma a uma, aquelas gigantes
foram fechando as portas, e o que se perdeu não foi só a marca — foi a
experiência: o Natal vivido com os pés cansados, as mãos cheias de sacolas e o
coração carregado de expectativa. A criança puxando o pai pela manga, o adulto
fazendo contas de cabeça, o vendedor desejando “Boas Festas” com um sorriso
sincero.
Hoje, tudo é rápido, tudo é
entrega, tudo é agora. Falta o caminhar lento entre corredores iluminados, a
sensação de que o Natal estava ali, palpável, embrulhado em papel colorido. As
lojas fecharam, as vitrines se apagaram, mas, para quem viveu, Lobras, Mesbla, Mappin,
Arapuã, Jumbo Eletro, Casa da Louça e Gigante do Lar continuam abertas —
funcionando em horário integral na memória, especialmente no Natal. Naquele
tempo, o Natal também era tecnologia, mas uma tecnologia com alma: a televisão
nova, comprada a prazo, tornava-se o centro da sala e o orgulho da casa; o
toca-discos embalava a ceia, o liquidificador fazia barulho de conquista. Cada
aparelho tinha peso, valor e significado. Nada era supérfluo. Tudo era vitória
— e, entre os quatro carrinhos do meu autorama, o mais rápido era o amarelo. As
voltas se acumulavam no conta-giros, rodando sem fim, e o som do motor ainda
ecoa na memória: vrrrrrrrrr…

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