Páginas

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Eu fiz parte dos ‘Meninos de kichute’.


Fábio Trancolin



Tem coisas que não saem da minha memória, elas estão bem recentes mesmo que tenham acontecido há quase 40 anos, elas fizeram parte da minha adorável infância, mas para muitos dos meus amigos, têm coisas que eles não usaram e nem ouviram falar. Recentemente, fui ouvir uma palestra e o conferencista citou o famoso ‘kichute’, acredito que a maioria das pessoas que estavam na plateia nunca viu um exemplar do mais famoso calçado da molecada da década de 70 e 80, era um misto de tênis com chuteira, e tinha como slogan ‘‘kichute, calce essa força’’. Foi o tênis da minha infância, aquele que te levava a todos os lugares, pois ele servia pra tudo mesmo, o tênis da escola, do futebol e de sair também... O “kichutão” quando estava novo era ‘preto petróleo’, vinha num saco plástico e tinha aqueles resíduos de borracha, que se assemelham ao pneu novo da bicicleta, a ideia era ir para quadra ou correr no asfalto para que elas pudessem desaparecer o mais rápido possível, e lavar para ele perder a cor.   Foram muitos anos usando o “pretinho básico”.


Passei pela fase da conga, tive uma azul e uma branca, porém elas fizeram pouco tempo das minhas andanças, depois veio uma que era um pouco melhor e, com cores mais variadas, a Conga Alcolor, também, usei, comprei alguns pares lá na Casa Lacerda. Esse tipo de calçado também vendia nos armazéns. O Kichute usava até acabar para poder ganhar outro, tempos difíceis, lembro-me de certa vez, o meu abriu na parte de baixo e estava uma lástima, o pai então fez um remendo com arame, era domingo e tinha jogo na quadra do TG, o pai disse “amanhã eu te compro outro, mas até lá, vai assim...” É claro virou piada... Mas, também, virou história. Eu fiz parte dos ‘Meninos de kichute’.


Em 1981, eu morava em São Paulo, meu pai comprou um Tênis Bamba na feira de sábado na Rua Enéas de Barros, sabe que esse era um sonho para quem só usava kichute, ele era mais sofisticado e elitizado, não se comparava aos ‘Rainhas’ e ‘Topperes’, mas calçava melhor e combinava com a calça jeans. E, em novembro daquele ano, eu ganhei o meu primeiro Tênis Topper, esse foi para ir ao casamento da minha prima Cosete... Era um belo tênis, em detalhe verde e azul e de nylon, adquirido no Romão Calçados na Avenida Celso Garcia.  Hoje, as lojas de calçados têm “trozentos” exemplares nas vitrines que fica até difícil escolher... Boas lembranças dos tempos em que se amarrava o cadarço na canela e era o velho e bom parceiro de bola.


No meio da década de 80 (lá pelos anos 85 e 86), as coisas estavam melhores financeiramente falando, então apareceu nos nossos pés o All Star, esse era Top! Fez parte da minha adolescência, foi febre na geração 80... Gostava dos tons azuis, mas teve amigos que chegaram a usar na cor laranja, amarelo e roxo, até rosa choque teve gente que chegou a usar, ou tinha aqueles que mesclavam uma cor com outra era chamado de “vários em um”... Quem esteve lá, nesse momento deu vontade de pegar o “DeLorean” e retornar ao mundo mágico da geração 80, ouvir as bandas de rock (nacional e internacional) do bom som da década de ouro. Calça jeans, tênis, camiseta de mangas dobradas e walkman nos ouvidos a fita cassete tocava RPM...  


sexta-feira, 25 de julho de 2014

Mudança


Fábio Trancolin


25 de julho de 1987...  Estava um tempo nublado e fechado, era um sábado. Preparava-me para uma mudança, um tanto quanto radical na minha vida. Voltar a morar em São Paulo. Nasci lá, porém fui criado nas terras da pequena cidade do Planalto Central, naquela época Rio Verde era uma pequena cidade do interior, os seus relacionamentos eram outros... Tive uma rápida passagem pela cidade grande entre 81/82. Mas naquele ano chegou o momento de voltar a enfrentar a “Paulicéia desvairada” cidade grande, ir em busca de oportunidades que aqui não encontrava. Por um lado sentia em deixar os amigos que eram muitos, mas ir causava certo interesse, envolvia outros fatores...

Naquela semana que antecedeu à mudança, causou tristezas, uma delas foi o atropelamento da minha cadelinha, a Katy, tinha levado para vacinar, dei banho e preparei para viagem, tanto ela quanto a filha, a Pepita, eram duas cadelas da raça pequinesa. No sábado dia 18, ela foi atropelada por um caminhão na porta de casa... (Foi um baque...).

Para a mudança, foi resolvido que não se levariam os móveis... Quase tudo seria vendido e foi. O pregão do Zé arrematou tudo que estava à disposição. Resolvemos apenas levar a TV (Foi presente dos dias das mães do ano anterior...).  Não existia mais a marcenaria, as máquinas eu tinha vendido para o Orlando. O amigo Selmo, sempre presente, nos ajudou a desmontar tudo e eu via a casa ir ficando vazia, a Kombi do pregão na porta ia sendo carregada. O primo Claiton passou por lá, e levou alguns utensílios, que não interessava para a venda, colocou na carroça que ele tinha. O primo Alexandre tinha separado algumas coisas, porém deu “bobeira” e o Claiton moleque que era, levou as coisas dele. Cena hilariante, a carroça em disparada e o Alexandre correndo atrás gritando, isso é “meu”, era uma chicotada na égua e outra nos meninos... Quem disse que pegaram...


A mãe fez um pedido para que eu cortasse o cabelo, como sempre gostava de usar o cabelo comprido, e ele estava grande, ela me disse: “Vai lá cortar, não viaje assim, não vai chegar lá desse jeito”. Pedido de mãe foi atendido, meio contra vontade. Ali na Avenida Presidente Vargas, onde hoje está a Casas Bahias, tinha a Casa do Granjeiro do meu amigo Charles, ao lado tinha um Salão de Barbeiro, cortei tão curto que ficou arrepiado... Desci fui até a tabacaria do Pedro Honório, onde hoje está o ponto de táxi do Adejair. Ali comprei um maço de cigarros Camel (naquela época eu fumava). 


Às 16:30, o Nacional Expresso encostou no box, ali começaria a viagem... Na hora de partir, três amigos foram se despedir... Selmo, os irmãos Nakayamas Aloisio e Marilsa... Lembro-me dos três acenando quando o ônibus desceu a avenida... Na manhã do dia seguinte, lá estávamos nós, eu a mãe e o pai com a Pepita na coleira (ela também viajou...). O Tio João nos aguardava com seu Chevette cor de creme... Eu louco pra chegar, pois queria ver a Fórmula Um, naquele tempo, eu aficionado pelo esporte, é era o GP da Alemanha, que foi vencido por Nelson Piquet. 


Ali muitas coisas aconteceram nos 12 anos que por lá passei... Outras tantas histórias... (que ainda vou contar)...  E, em março de 1999, eu estava de volta... De volta pra casa, pois aqui acredito que seja é o meu lugar... Quando perguntado se eu sou paulistano ou goiano, respondo que sou uma “pizza de pequi”.




segunda-feira, 21 de julho de 2014

O Poeta Rubem Alves


Fábio Trancolin

Sábado depois do almoço fui me interar das noticias, e a primeira que vi, era que Rubem Alves tinha retornado ao Plano Maior. Desencarnava um dos meus autores favoritos, Mestre na arte de escrever, e apaixonado pela educação. Sonhador como muitos que tem a arte da paixão dos livros. Mineiro de Boa Esperança. Há sempre uma esperança onde se tem livros... Fazia aniversário no mesmo dia que a minha mãe, e era do nosso setembro primaveril. Ele foi O poeta, o guerreiro e o profeta... Ele tinha Alegria de ensinar. Essas frases caem tão bem, e são dois títulos de livros que ele escreveu.


Certa vez assistindo uma entrevista dele, ele disse que: ‘Só fale se sua fala for melhorar o silêncio... Eu prefiro o diálogo, eu prefiro conversar... E ninguém pensa em escutar, todo mundo quer falar...  Falar é uma arte, quando se fala pouco e se escuta muito... Isso é a arte de aprender a ouvir, então aprenda com o Mestre. E nas Casas Espíritas sempre se encontra essa frase: O silêncio é uma prece, deveríamos colocar isso em pratica, pois isso nos ajudaria muito na nossa jornada. 

E esticado no sofá e com o controle na mão, aperta um, dois e outros tantos números, aparece ele... Lá estava ele de forma serena e com voz tranquila e cansada numa entrevista concedida em 2012: Algumas coisas eu guardei na memória sobre o que ele disse: ‘O professor não morre nunca, pois ensinar é o exercício da imortalidade... Eu espero estar vivo depois de morrer, espero que as pessoas se lembrem de mim, eu estarei vivo quando as minhas frases forem citadas... E quando alguém falar...  Ah, o Rubem eu tenho saudade dele... Isso é que é imortalidade’. Eternidade não é o tempo sem fim... Tempo sem fim é insuportável... Tudo que é belo tem que terminar... Cada momento de beleza vivido e amado que efêmero que seja, é uma experiência completa que está destinada a eternidade... Um único momento de beleza justifica a vida inteira...


Essa é uma pequena homenagem a ele que se foi, e ficou... Está imortalizada nos livros, nos pensamentos, textos e frases que deixou.  Na minha estante tem alguns... E nas bibliotecas de outros tantos, espero que a procura aumentem nas prateleiras das livrarias... Não tenho muitos, se possível fosse gostaria de ter todos. E entre os que eu tenho um guardo com muito carinho, ‘As melhores crônicas de Rubem Alves’, E esse livro me foi presenteado por uma pessoa mais que especial, e hoje quando escrevo essa crônica, é dia do amigo. Obrigado pelo presente adorável Arlen Matos, que também tem o Rubem Alves como o seu autor favorito. E espero um dia também ter as minhas crônicas publicadas: As crônicas de Fábio Trancolin. 


segunda-feira, 14 de julho de 2014

O aroma do café


Fábio Trancolin

Eu adoro café, posso dizer que tenho verdadeira paixão por café. Essa bebida mágica tem mais de 1200 anos, sua história começou no século IX em terras africanas, ele se originou na Etiópia, foi cultivado no Sudão e também no Quênia. Ele foi difundido pelo mundo através do Egito e depois pela Europa. No princípio, pensavam que a palavra café originava de Kaffa que era o local de origem da planta, a palavra vem qahwa que significa vinho devido à importância que a planta passou a ter para o mundo árabe. Em um conto sobre o líquido precioso, tem uma narrativa que fala sobre um fanático religioso chamado Omar, ele foi expulso de Moca (Moca – Fica no Iêmem é uma cidade portuária, o mais antigo porto de exportação de café) e se refugiou nas montanhas da Arábia. E nesse período que por lá, passou, provou alguns frutos estranhos que cresciam num arbusto. Como eram amargos, ele tentou melhorar o sabor, tostando-os sobre o fogo. Isso os tornou quebradiços, e ele tentou amolecê-los na água, e quando a água na qual os grãos estavam imersos se tornou marrom bebeu e descobriu como aquilo era bom e revigorante. Isso foi lá pelos idos do século treze. Muito antes disso, o café crescia à vontade na Abissínia (Etiópia).  São várias histórias sobre o líquido idolatrado por milhões.


Na minha casa, nunca faltou, ele sempre esteve presente. Quando era criança, lembro que na cozinha, a mãe tinha uma lata cor de creme com a tampa marrom que ela guardava o café e o açúcar era guardado numa lata com estampas de carros antigos, elas, por muito tempo, estiveram por lá, nas mudanças que foram muitas, elas se perderam. 


Em 1974, eu tive a oportunidade de morar ao lado de uma torrefação, a casa ficava na Rua Costa Gomes, esquina com Viela Jatai. E o nosso vizinho era o Café Rio Verde que começou a sua história em 1958. A sua embalagem tradicional em papel na cor vermelha e verde, naquela época não existia embalagem a vácuo, o café era vendido moído ou você pedia para moer na hora. E todos os dias, no meio da tarde, a torrefação do Senhor Gerson expelia um aroma agradável que perfumava a parte baixa da cidade. Aquele cheiro invadia as narinas e aumentava a vontade de saborear a bebida confortante e viciante. Nas casas das “senhorinhas” das mãos maravilhosas que amassavam as suas quitandas, elas vinham acompanhadas pelo ‘dono da tarde’. 


Hoje, ao sair do trabalho, eu passo pelas ruas que, naquela época, não tinham asfalto, eram no cascalho. O cheiro que invadia o nariz era o café torrado e a palha de arroz sendo queimada, ou a fumaça que vinha das fogueiras que as lavadeiras faziam com a serragem e madeiras que elas buscavam na marcenaria do ginásio, onde o pai tirava o sustento da nossa casa. Eu lamento, pois não é esse cheiro que você sente hoje... Alguns dizem que é o cheiro do progresso, eu dou outro nome... 



   


segunda-feira, 7 de julho de 2014

Sou taxista, no asfalto eu sou artista.


Fábio Trancolin
Na história o hábito de transportar pessoas surge com o aparecimento do riquexó, — carro de duas rodas puxado por um só homem. Existia, porém pouco utilizado pela população nas principais cidades da antiguidade, mas era exclusivo das elites, que possuíam escravos para puxar esses carros. O táxi propriamente dito apareceu historicamente quando foram aplicadas taxas à sua utilização através de taxímetros.


Na Alemanha, mais precisamente na cidade de Stuttgart, no final do século XIX, apareceram os primeiros táxis motorizados. Em 1897, Freidrich Greiner abriu uma empresa com os seus carros, utilizando um sistema inovador de cobrança — o taxímetro. Antes da Primeira Guerra Mundial, todas as grandes cidades europeias e americanas tinham serviço de táxis legais e pintados com esquemas de cores diferentes. 
      

O cinema imortalizou os táxis amarelos de Nova York, é show ver os “fusquinhas” verde e branco nas grandes avenidas da Cidade do México. Nas ruas de Nova Deli, os auto-rickshaws (tuk-tuks), e, em Londres, os charmosos icônicos Black Cabs. Em São Paulo, a frota dos carros brancos ultrapassa 33 mil carros. Em pequenas cidades, não é necessário a cor padronizada e o uso de taxímetro, o valor é tabelado, é cobrado pela corrida. 


Fiz esse pequeno resumo de como surgiu o táxi, para contar a história de um taxista, que podemos dizer que é patrimônio cultural da cidade, o “Adejair do táxi”. Ele está na profissão há quase 40 anos e, durante esse período, sempre na Avenida Presidente Vargas, tudo começou em 1976 no ponto de Táxi São Jorge, em frente à sorveteria do Senhor Aildo, com o Opala 73 vermelho ou bordô, vinho ou seja, a cor que for, virou amor, virou paixão, apaixonou e em profissão se transformou. 

Em 1977, ele adquiriu um Corcel preto que era do Senhor Atef (Dono da Casa Flor do Líbano), ele disse que atravessou a avenida e perguntou “Prima quer vender carro?”, no que o libanês respondeu “pra você prima vende”. E o negócio foi fechado. Em 1983, ele adquiriu o primeiro carro zero Km, foi um Gol branco, ele comprou na Distribuidora Sudoeste que naquela época era na Rua Abel Pereira de Castro. No mesmo ponto, há quase 30 anos, ele é figura referência na avenida, não tem quem não conheça o “Adejair do táxi”. Na cidade, têm aproximadamente 100 taxistas, ele é um dos mais antigos, o Dirceu que faz ponto na rodoviária é o mais antigo. 


Ele tem história, tem muito que contar, a vida nele não se resume em um capítulo ou numa crônica, daria um livro. Ele já viu, e ouviu coisas, mas nas palavras dele: “Taxista não ouve, apenas observa”. “Sou taxista, tô na rua, tô na pista, não tô no palco, mas no asfalto, eu sou artista”. E, em quase 40 anos de profissão, apenas uma vez ele foi roubado, em uma corrida que ele fez para cidade de Bom Jardim.

E outro tema que faz dele diferenciado, e o fato de ser um amputado, nosso personagem perdeu o braço direito em 83 (E para ser mais exato, no dia 15 de março 1983). Ele disse: “Iris Rezende chegava ao governo do Estado, no mesmo dia eu perdia o meu braço... “ E para quem pensou que ali terminaria a história profissional se enganou, pois até hoje ele lá está no ponto, sempre a espera de um passageiro, com a gentileza e educação que encantam a todos que utilizam os teus serviços. Nada afetou a sua acessibilidade. É muito agradável sempre que possível parar e conversar com o meu amigo, sim, ele é meu amigo.