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terça-feira, 27 de maio de 2014

Cheiros e sabores


Fábio Trancolin

Os sabores da época de criança e seus cheiros inconfundíveis eram uma mistura de tudo o que há de bom e gostoso. Em outras crônicas eu relatei cheiros, gostos, lugares e aromas que fizeram parte da infância e que não saem da memória. Já falei do Zé da Vitamina, dos armazéns e doces que eram vendidos em seus balcões e baleiros, já comentei das maçãs do amor da Pecuária. Dos salgados e rosquinhas dos “japonês”. 'O “Ligeirinho” e os seus salgados tem que ser citado, no vai e vem, com a bacia na cabeça, lá vai ele de havaianas sobe que desce e desce que sobe. Vale também lembrar o caldo do “Biras Bar”, quando ele era ali em frente aos Correios, no final de tarde, as mesas e cadeiras eram procuradas pelos apreciadores do mocotó. 

Na foto Weber (Bar do Weber) e Webinho. Rua Gumercindo Ferreira
Outros cheiros inesquecíveis eram os das padarias, tenho que falar de três que estão gravadas na lembrança de todos os que tiveram a oportunidade de saborear algumas iguarias em seus balcões, a Padaria Natal, que ficava ali onde está o Itaú na Rafael Nascimento, e a Flor do trigo que ficava na esquina da Costa Gomes com Coronel Vaiano, a Padaria Universo na Presidente Vargas, era um aroma que invadia narinas e te convidava a entrar. 

No lado direito da foto esta a Padaria Natal 
Quando a buzina tocava e ele gritava, “oh o picolé e juju”. Moedinhas eram ajuntadas e corriam atrás dos “picolezeiros”, os do Bar da Terezinha (o bar era na descida do Demolício de Carvalho esquina com a Rua Rui Barbosa) e os da Sorveteria Brasinha (era ali na Augusta Bastos). Era uma delícia o creme holandês, e o coco queimado. Nas portas de escola, e nas ruas se ouvia a buzina ao longe te chamar, vem experimentar... Muitos amigos empurraram os carrinhos que eram abastecidos até a tampa, eles saiam percorrendo as ruas da cidade que não era tão grande assim, logo chegavam ao fim dos seus limites, mas tinham aqueles que ousavam ir bem longe, lá pelos lados do Posto Horizonte que era longe “pra caramba” a disputa era boa, mas todos vendiam muito. 


Mas tem dois sabores que quem experimentou jamais esqueceu o picolé de groselha e o sorvete de ameixa do “Bar do Weber”. Por muitos anos, ele ficou instalado na Praça Rodrigues de Mendonça (hoje é a Perfil Contabilidade), ali era ponto de encontro, frequentei muito ali. Depois ele mudou para a Rua Gumercindo Ferreira, e eu continuei frequentando... São coisas que você não esquece, “tudo que vai, deixa o gosto, deixa as fotos, quanto tempo faz... Deixa os dedos, deixa a memória... “ Como é bom lembrar, recordar e sentir saudades...  Como diz o escritor alemão Patrick Süskind, “O aroma é um irmão da respiração ele penetra nas pessoas...”.




segunda-feira, 19 de maio de 2014

A turma da rosquinha


Fábio Trancolin


Um tema muito discutido e que causa debate. A questão das crianças poder trabalhar. Na constituição, o jovem só pode trabalhar a partir dos 16, a partir dos 14 só na condição de aprendiz. Na questão da TV, diz a lei que “a participação de crianças em teatro, programas de televisão ou filmes não é considerado um trabalho regular na medida em que se trata de uma manifestação artística”. É ou não é um trabalho... Estranho esse ponto. Comecei falando disso, pois hoje me veio na lembrança uma família amiga, os “Nakayamas”, tendo com matriarca a Dona Carmem, que carinhosamente chamo de tia. Ela gerou oito filhos, Yuki, Minoro, Marilza, Meire, Aloisio, Auro, Lauro e Akira. Por 10 anos, eles venderam rosquinhas e salgados nas ruas de Rio Verde, eram figurinhas conhecidas no comércio local. Pequeninos e com a bacia na cabeça ou apoiada no quadril lá “iam eles” de porta em porta. 


Entre os anos de 72 a 82, eles estiveram nas ruas, e o faturamento com as vendas das rosquinhas era o “ganha pão” da família. Dona Carmem separou cedo do esposo, o filho mais velho Yuki foi morar com o pai e não fez parte da ‘turma da rosquinha’, os outros sete ficaram com a mãe. O Minoro saía com a bicicleta carregada e voltava com ela vazia. A pequena Akemi que com sete anos estava na lida, a japonesa das coxinhas e rosquinhas era o xodó de muitos comerciantes. Na marcenaria do meu pai, eles sempre passavam por lá os mais novos, Auro, Akira e o Laurinho, os marceneiros compravam as rosquinhas e queriam pagar depois, mas ninguém conseguia ficar devendo para “os japas” eles “caiam” em cima cobrando e sempre levavam o dinheiro pra casa, o que é justo é justo. 


O Aloisio conta que tinha algumas pessoas que, às vezes, arrematavam todas, só para poder passar as rosquinhas no fundo da bacia para lamber o creme que acumulava no fundo. E que era uma delícia, eu tive o prazer de saborear essas “quitandas”! Eles ajudaram no sustento da casa, tiveram infância, brincaram e estudaram. Nenhum deles se sente explorado. Nenhum filho da Dª Carmem reclama dessa situação, para eles é uma satisfação poder contar essa história. Foi através do trabalho dos meninos que a casa foi mantida. Dona Carmem levantava cedo para amassar a massa e depois enrolar e assar, e as crianças saíam com as bacias cedo e à tarde, sempre tinha um japonês na rua vendendo. Aqui ninguém foi explorado, estudaram e cresceram felizes.


Hoje a Tia Carmem está com 81 anos, bisavó (Sõsobo) avó (Obaasan) e mãe (Haha) realizada, sempre que posso vou visitá-la, ela diz não conseguir mais fazer as rosquinhas do passado, ‘antes era tão fácil e prático’. Mas, quem saboreou, nunca esquece o sabor de carinho, amor e afeto e muito sacrifício. 

Os oito filhos da Dª Carmem, Akira, Lauro, Aloisio, Marilza, Meire, Minoro,Yuki e Auro





segunda-feira, 12 de maio de 2014

Nos campinhos de terra batida


Fábio Trancolin

Muitos meninos tiveram um dia um sonho de ser jogador de futebol, e esse sonho começou lá nos campinhos de terra batida. Tantos e tantos imaginavam a possibilidade de algum dia realizar esse sonho, não é como hoje que às vezes acaba virando obsessão.  Mas, na minha época, a maioria jogava era por pura diversão. Naqueles tempos, não existia essa fixação em busca da profissão. Mas tinha aqueles que tinham isso como objetivo. Dos amigos com os quais joguei muitas peladas, me recordo de três que viraram profissionais, o Frei, Tom e o Serginho. Vários outros jogavam muito, mas ficaram no amadorismo.


Nos anos 70 e 80, tínhamos muitos campinhos espalhados pela cidade e a molecada se divertia. Atrás do Estádio Mozart Veloso do Carmo, onde hoje o espaço é utilizado pelos carros das autoescolas, ali era um terrão. Onde está a estação rodoviária, também, tinha um belo campo de terra. Em frente ao Clube Campestre, tinha outro. No Parque Betel, onde hoje é o Bairro Canaã tinha um campo desnivelado. Lá pra bandas do fundo do parque de exposição, também, havia alguns e, também na Vila Maria, atrás do Posto Horizonte. E, sem contar aqueles que nós improvisávamos, atrás da Faculdade Objetivo, na “vilinha do matadouro”. Nas margens do córrego do sapo, carpiram e fincaram duas traves e o campo foi elaborado, e era só correr atrás da “gorduchinha do capotão”. Em frente ao Hexa (no passado Clube dos bancários), tinha um terreno enorme que também servia para o futebol. Onde hoje está a CDL, o pessoal das máquinas de beneficiar arroz jogavam as palhas e nós espalhávamos e mais um campinho estava feito. 


No Posto Vip, também, era um campinho, pequeno, mas também batemos uma bolinha lá. Onde hoje é o Hemocentro, ali fizemos um campo com palha de arroz nos gols e, nos finais de tarde, jogávamos, porém, tinha um funcionário da maternidade que não gostava muito da ideia. E, nesse campinho, uma vez limpamos todo o terreno, e recolocamos as traves que o rapaz tinha tirado, estava tudo pronto, só faltava a bola, essa estava vazia e eu fui encher na borracharia do Seu Nego, o ajudante dele excedeu no ar, a galera à espera e, eu dei um “balão”, quando ela bateu no chão, estourou, acabou o jogo, não tinha outra.  Não posso deixar de citar o campo do Martins Borges, onde hoje está o Colégio Oscar Ribeiro. Em todos esses que mencionei, eu joguei. 


No módulo esportivo, o Wilson Ataíde treinava uma garotada, os meninos do Wilsinho. Muitos eram meus amigos, Carlinhos, Toninho, Lazinho, Cairo Perereca, Hélio Rosa, Gutemberg, Assis, Preto, Manoel, Ênio, Rildo e Cleuber e outros tantos... Uma vez me chamaram para que eu fosse treinar lá. Não “tava” muito afim, mas depois da insistência de alguns amigos, acabei indo numa tarde. Chegando lá, não falei nada com o professor, ele começou o aquecimento, e eu entrei na turma, davam algumas voltas em torno do campo, alguns exercícios, e depois escolhia os times. Eu não tinha chuteiras, fui com o velho ‘Bamba’, um pra cá outro pra lá, os times foram sendo formados, ele me olhou, e perguntou. “E você em que posição joga?”. Eu jogo do meio pra frente, respondi com tranquilidade a pergunta que foi feita. E ele me disse, “então fica de quarto zagueiro”. Já tinham me falado dessas tiradas dele. Certa vez, um amigo foi treinar, e ao ser perguntado em que posição jogava, respondeu, “em qualquer uma”, ele disse, “então fica de fora e espera qualquer uma”. Não retruquei, acatei a solicitação e me posicionei. Mas, no fundo fiquei chateado, eu era muito rápido, corria muito, mas em termo de marcação era uma negação. Na primeira bola que rebati, armei um contra ataque do adversário, gol... O Manoel nem viu onde a bola entrou...  O treinador esbravejou quem foi que fez isso? Levantei a mão e me desculpei. No resto no coletivo, perdi a calma, acertei o ponteiro esquerdo dele, era o Marcelo Raina, um “loirinho almofadinha”, papai dele que estava na plateia, ficou louco pela entrada que dei. Acertei mais uns dois, na virada de campo, o “Cabaré” veio e me disse, olha o treinador pediu para que eu te substitua se não você vai acabar com a linha de frente dele, e não vai ter atacante para o final de semana. Saí, fui embora chateado, enviando um monte de palavrões mentalmente para ele, e não voltei mais... Depois joguei algumas vezes contra. Como eu falei no começo, tudo era diversão, e se era para divertir, eu posso afirmar isso, foi o que eu mais fiz...  

Em pé: Wilsinho, Olair, Toninho, Juninho, Frei, Cairo (Perereca) E Lazinho. Agachados: Picolé, Miranda, Rildo, Mizael E Paulo Sérgio. O E.C. Rio Verde com a faixa de Campeão de 1981. (Arquivo de Wander Iwata)



segunda-feira, 5 de maio de 2014

Quando valia a pena torcer


Fábio Trancolin

“Eu me lembro com saudade o tempo que passou, o tempo passa tão depressa... Jovens tardes de domingo, tantas alegrias... “ E a nossa alegria nos domingos era acompanhar o pai numa partida de futebol, à tarde, lá íamos nós rumo à Vila Amália para assistir aos jogos do Verdão do Sudoeste. Era um programa para a família, o marido levava a mulher e os filhos. Arquibancada só de um lado, do outro era terrão. Uma parte coberta a outra não, mas isso não interessava muito. O bom era o jogo. Picolé e “juju” dos carrinhos “Brasinha” e do Bar da Terezinha, amendoim, laranja que com certeza era “arma” na mão de alguns...

                                                                                   Arquivo: Aires Humberto
Na orelha o “motorádio” sintonizado na Difusora AM, Mauro Moraes narrava, e outros comentavam, entre eles Luiz Braz e o professor Antônio Edson. Na década de 70, íamos ver o alviverde nos grandes embates contra os grandes da capital, e a rivalidade contra a Jataiense. O estádio sempre lotado, naquela época, a população comparecia, era gostoso estar presente, às vezes atrás dos gols com a cara no alambrado. Certa vez, estava atrás do gol da entrada e a bola ficou quicando dentro da área e o Chatuba numa pancada estufando as redes onde eu estava... Era maravilhoso ver o esquadrão alviverde subindo as escadas do vestiário, entravam de camisa verde, calção e as meias na cor branca. Tínhamos o Chatuba, Toninho Xerife, Radar, Chundí, Palito e o Mug, no gol o Serginho, foi uma pena esse time não sagrar-se campeão, chegou próximo em 77, deu Vila.


Em 1978, teve um grande jogo na cidade, o Flamengo veio jogar na cidade foi um amistoso, na escalação do time carioca só faltou o Zico, estavam presentes Cantarelli, Ramirez, Rondinelli, Junior, Carpegiani, Adílio e Tita... O jogo ficou 0x0, porém o time de preto e vermelho tomou um sufoco do Verdão do sudoeste, o Mug e Radar infernizaram no ataque, só faltou o gol, teve um lance que tinha endereço certo, já tinha passado pelo goleiro, Junior Brasília salvou em cima da linha, o que seria o gol da vitória do Rio Verde.  Eu assisti ao jogo atrás do gol, que hoje fica do lado do Ginásio Jerônimo Martins. Naquela tarde, o estádio ficou lotado, não éramos flamenguistas como muitos ali não eram, porém era um grande time com jogadores de seleção, tinham que ser prestigiados e foram.


Na década de 80, o time já não encantava mais como os dos anos anteriores, mas, mesmo assim, íamos ver o Verdão, tinha o Miro o ‘goleiro Voador’, Pavão, Gercival, Soares, Wagner Isidoro, Gaúcho e Serginho Leão no ataque. Íamos porque gostávamos de futebol, teve vez que, nas quartas-feiras, matávamos aulas e saímos do Colégio do Sol para ir ao estádio ver o time. Lembro-me do cheiro de estádio com a fumaça do churrasquinho misturado com cheiro de explosão de rojão. Já assistimos jogos ensopados pela água da chuva. Já vi sopapos entre torcedores adversários, principalmente, os de Jatai, era encrenca na certa. Eles colocavam uma abóbora na ponta de vara e balançava, isso era um afronta para os torcedores de camisas verdes. Certa vez, o Martinho (Grande amigo da família que já voltou para o Plano Espiritual) picou uma abóbora no tiro, tempos em que andar armado não era considerado crime, ele sempre tinha um “Três oitão” na cintura... O torcedor abaixou a vara e sumiu... 



Os anos passaram, o Esporte Clube Rio Verde, já não é o mesmo dos tempos que encantava, naquela época só o símbolo no lado esquerdo do peito, a camisa sem patrocínio, o que valia era a raça e determinação, o coração na ponta da chuteira, isso nos dava emoção, e galera vinha ao delírio pendurada no portão. Fiquei muitos anos sem ver o Alviverde, e fiz como o meu pai, levei o filho para ver o Verdão, em um jogo da segunda divisão entre os times da cidade, a Associação Atlética Rio-verdense, de azul, branco e vermelho, estranha sensação, nós torcemos pelo de Verde e Branco, placar elástico 5x3 para o Verdão. Na estreia do Goianão de 2012, eu fui como imprensa, colete laranja, era a primeira vez que estava do lado de dentro do campo, ali na beira do gramado, no primeiro jogo derrota para o “Dragão” 4x2, prestigiei o jogo contra a Anapolina, empate por 1x1, depois não voltei mais no estádio. Perdeu aquele encanto de jogo de domingo à tarde em que torcíamos com verdadeira paixão. 





quinta-feira, 1 de maio de 2014

SENNA ‘THE BEST’



Fábio Trancolin


No natal de 1974 meu pai me deu um autorama, presente esse comprado na Casa das Louças, o Fitti Show em homenagem ao Bicampeonato mundial de Fórmula 1 de Emerson Fittipaldi 72/74. Não era tão popular a Fórmula 1, o futebol era mais interessante. Nas nossas corridas de carrinhos de rolamentos colávamos maços de cigarros Marlboro imitando o patrocinador oficial da F1. Às vezes víamos as corridas, não era com frequência... 


Na temporada de 81, o Brasil ganha o terceiro título na categoria, dessa vez com Nelson Piquet, e nesse ano uma corrida em especial me chamou à atenção, o Grande Prêmio do Canadá, eu morava em São Paulo, e assisti com o Tio Gilberto, vimos o canadense Gilles Villeneuve dar um verdadeiro show debaixo de um temporal com a asa dianteira destruída, quase que sem visão ele conduzia como se nada tivesse acontecido e subiu no pódio em 3º. O interesse cresceu pelo esporte automobilístico, nessa época o chiclete Ping Pong lançou uma coleção de figurinhas da temporada 82, eu juntei. Naquele ano no dia 8 de maio no circuito de Zolder na Bélgica, Villeneuve sofreu o acidente que entrou para história como o mais violento da era moderna da Fórmula 1, morria ali um dos pilotos mais arrojado e destemido que passou pela categoria, sem nunca ter conseguido um título, ter alcançado apenas 6 vitórias, ele até hoje é considerado para os ‘Ferrarista’ a alma do ‘cavallino rampante’, em recente pesquisa ele leva vantagem no coração do torcedor da Ferrari em relação a Schumacher que conquistou cinco títulos pela escuderia de Maranello e mais de 70 vitórias pela equipe. 


Virei um verdadeiro fã de Fórmula 1, assistia todas as corridas, lia e comprava tudo o que aparecia sobre o esporte, e fazia as minhas anotações. Na temporada de 83, o título mais uma vez veio para o Brasil, o 4º título e o bicampeonato de Piquet. Nas transmissões se falava muito em um piloto que vinha pulverizando os recordes das categorias de acesso, era nome certo para temporada do ano seguinte. E no grid do GP do Brasil, 25 de março de 1984 ele estava lá, quatro dias depois de ter completado 24 anos, era a estreia de Ayrton Senna na principal categoria de automobilismo. Ele deu apenas 8 voltas com o seu Toleman, e abandonou, na prova seguinte o primeiro ponto na carreira, GP da África do Sul ele chegou em 6º. A primeira vitória poderia ter acontecido no GP de Mônaco o sexto da temporada, se não fosse a manobra do diretor de prova o ex-piloto Jacky  Ickx, que parou a prova e deu a vitória para Alain Prost, foi o primeiro pódio, ficou em segundo, mas sabendo que era o ‘primeiro’... O recado estava dado, veio para vencer ...  Naquele ano foram três pódios. 


Quando começou a temporada de 1985 ele pilotava a Lotus, um dos mais belos carros da história da Fórmula 1, naquele ano até o cigarro que eu fumava era o JPS, era o patrocinador oficial da Lotus. E com a preta e dourada debaixo de um verdadeiro dilúvio ele cruzou a linha de chegada no Estoril em primeiro, naquele domingo em que o presidente que não tomou posse voltava para o Plano Espiritual, o ‘herói enforcado’ era lembrado, o novo Herói nacional comemorava o triunfo no dia 21 de abril. Seis vitórias e três temporadas depois, os especialistas diziam, ‘Senna tem a inteligência de Fittipaldi, a frieza de Lauda e o arrojo de Villeneuve’. Ele assinou com a McLaren-Honda e dava inicio a uma parceria vitoriosa. E naquele ano de 88 o melhor piloto com o melhor carro, e um ‘companheiro rival’ extremamente competente o ‘Professor’ Alain Prost, o Herói fez 13 poles e 8 vitórias. E na madrugada de 30 de outubro, o titulo era dele em uma corrida extraordinária, depois de largar na pole e cair para 14º lugar e fazer uma bela corrida de recuperação o Campeão do mundo era ele. No ano de 89 os poderosos puxaram lhe o tapete, 90 e 91 ele tratou de colocar as coisas no lugar e entrava no seleto clube dos tricampeões. 


Depois de muitos anos sendo realizado no circuito de Jacarepaguá, em 1990, o Grande Prêmio passou a ser disputado no circuito de Interlagos, Ayrton foi um dos principais articuladores e na reforma ele desenhou o S do Senna, ele tinha tudo para levar a vitória daquele ano e estava na liderança quando um japonês atrapalhado (Satoro Nakajima) lhe tirou a vitória depois de uma fechada.. Em 91 uma corrida que entrou para Hall das maiores vitórias do Magic, num final dramático, com apenas a sexta marcha, e com extremo desgaste físico ele recebeu a bandeirada na sua terra, aos berros de dor misturado com lágrimas e com muita emoção, realizava um sonho, ganhava em casa. Essa é uma das mais lembradas da carreira do Herói, a imagem dele sem forças para erguer o troféu no pódio demonstra a garra a determinação e vontade de vencer acima de todos os limites. 


Em 1993 quando teve inicio a temporada daquele ano, Senna sabia que seria um ano difícil e enfrentar as poderosas Williams da mesma forma que não tinha sido na temporada anterior, e não foi nada fácil, mas mesmo assim ele venceu cinco corridas, venceu em casa e comemorou nos braços do povo, se tornou o Mister Mônaco vencendo seis provas, sendo cinco consecutivas (89, 90, 91, 92, 93). Na prova do GP da Europa em Donington Park, considerado pela maioria dos especialistas em automobilismo como a ‘corrida da volta perfeita’. Em novembro no dia 07, na Austrália ele venceria pela última vez... (Não imaginávamos que essa seria a última)... Uma cena marcou o encerramento daquela temporada, Senna foi assistir ao show da cantora Tina Turner, a cantora o chamou ao palco, para cantar para ele ‘Simply the Best’ e dizia emocionada você é ‘The Best’... ‘The Best’... 


No ano seguinte ele realizaria o sonho de pilotar a Williams, o carro perfeito (pensávamos assim...), seria a temporada perfeita, melhor do que a de 1988. Imaginávamos que os três anos de contrato com a Williams, Senna acumularia recordes e mais recordes... Dizem que ele encerraria a carreira pilotando uma Ferrari, essa afirmação foi dada por Jean Todt o poderoso da Escuderia Italiana, que em 96 levou Schumacher para a Casa de Maranello, a vaga seria do Magic Senna. Nos seus três últimos Grandes prêmios, ele largou na pole e não terminou nenhuma, foram três acidentes...


Naquele dia do trabalho, aguardávamos a reviravolta no campeonato, Schumacher havia vencido as duas primeiras corridas, ali teria que começar a reação de Senna. Na sexta-feira, Rubens Barrichello sofreu um grave acidente, no sábado a morte de Ratzenberger. Na sétima volta quando ele entrou na curva Tamburello e Galvão Bueno gritou, ‘Senna bateu forte’, esperávamos que ele simplesmente saísse do carro, mas, ele não saiu... Ficou ali com cabeça tombada. Quando ele foi levado pelo o helicóptero a mostra de sangue na pista assustou, não era simples, era grave... A espera... As notícias... Quando Roberto Cabrini disse: ‘Não há mais esperança para Ayrton Senna, ele está clinicamente morto... ‘Parece que abriu um buraco, como o ‘Imortal’ morreu? Herói não morre, mocinho não morre no final... Mas era verdade, o Herói estava morto e a lenda viva. Os astrônomos italianos presentearam com uma estrela na constelação de Auriga tem uma estrela chamada Ayrton Senna, que vai brilhar eternamente.


Na empresa que eu trabalhava todos sabiam da minha admiração pelo ídolo, na minha mesa no porta caneta tinha a bandeira do Brasil, junto à foto dele. Após os GPs eu comprava pelo menos uns três jornais, e na empresa tinha a Folha de S. Paulo, no final do dia eu recortava tudo sobre a corrida e guardava, ainda tenho todos os recortes na minha casa. Naquela segunda-feira foi cruel ir trabalhar, todos vieram me cumprimentar, eu tinha perdido um ‘ente da família’... Na banca do Eduardo, tudo que saia sobre Fórmula 1 era guardado e me avisavam, chegou novidades... De álbum de figurinhas a Revista Grid... Dos cincos Grandes Prêmio que ele participou em São Paulo, não deu para ir a nenhum, faltava verba, era caro. Durante dez anos tudo que eu colecionei eu guardei numa caixa, depois do desencarne dele, lacrei e guardei...


Na quarta-feira (04.05) eu tinha um exame em uma clínica que ficava no Shopping Center Norte, enquanto tomava café assistia aos telejornais que mostravam que o corpo desembarcava no Aeroporto de Cumbica em Guarulhos, era recebido com honras de chefe de estado o HERÓI NACIONAL (O maior Herói que tivemos!). Saí de casa fui para o metrô, e me dirigi para o compromisso. Ao chegar ao terminal do Tietê, o shopping fica na saída do lado esquerdo, enquanto descia as escadas ouvi um barulho, e sai correndo em direção a Marginal Tietê que fica do lado oposto, e ao chegar à ponte sobre o rio, ao fundo vi, o cortejo que vinha em minha direção, quatro helicópteros da Força Aérea, sobrevoava o carro de bombeiros, outros tantos faziam a cobertura para TVs. Fiquei paralisado, o carro se aproximava e eu estático. A bandeira cobria o caixão do Mito, a cidade que não pára, mas naquele dia parece que parou. Quando ele passou na pista embaixo na Ponte das Bandeiras, a dois metros de onde eu estava, o nó na garganta, a dor da perda, eu chorei (mais uma vez)... Ali fiquei olhando para o vazio e imaginando quis tanto chegar próximo ao meu ídolo, e o mais próximo que cheguei foi ali naquele dia... E no pensamento ficou a vibração e as lembranças das voltas das vitórias... AYRTON SENNA DO BRASIL!!!!!